segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Formatos: Treinador, Diretor Técnico e o Vencer, Vencer, Vencer

 

Salve, Buteco! Semana passada, enquanto navegava pelas notícias de futebol nas redes sociais, deparei-me com uma situação familiar para a esmagadora maioria de frequentadores desse Blog, que acompanha futebol desde antes da reestruturação do Flamengo, ocorrida a partir de 2013. Refiro-me à situação do treinador argentino Luís Zubeldía no São Paulo Futebol Clube. Vejam bem, no período ao qual me referi não era comum o Flamengo ter treinadores estrangeiros, porém era absolutamente corriqueiro o cenário de salários atrasados, resultados negativos e treinador balançando.

Consta que, no coirmão paulistano, a coisa não anda nada bem. Seriam cerca de 4 (quatro) a 5 (cinco) meses com pendências relacionadas a premiação, direitos de imagem e luvas. Segundo Paulo Vinícius Coelho, o PVC, "Se o São Paulo chegar na semifinal do Paulista, está tudo bem - a não ser que chegue na semi e tome um 4 a 0 do Corinthians. Aí, já é um absurdo. Se cair nas quartas de final contra um pequeno - o Novorizontino -, aí vai ter risco. Por isso o jogo contra o São Bernardo é importante. Uma coisa é jogar contra o Novorizontino no MorumBIS; é muito pior jogar em Novo Horizonte."

Não consta nenhuma notícia de dirigente balançando. Só do treinador. Tanto que, nos bastidores, o nome do "bertolucciano" Fernando Diniz já é ventilado. Se o argentino Zubeldía não resistir, será ele que lidará com o contexto das pendências com o elenco, recentemente reforçado com grande investimento, e o estrelado (e caro) vestiário tricolor.

No Flamengo, até dezembro/2024, havíamos nos livrado da praga dos "salários atrasados" e da baderna em nível de gestão administrativa e financeira; contudo, a praga da frenética rotatividade de treinadores continuava viva e muito forte, tudo porque, no clube, o futebol continuava a ter comando amador e, dentro desse formato, todo mundo poderia ser responsabilizado, desde os jogadores até, na maior parte das vezes, o treinador. Mas nada acontecia com os dirigentes.

A nova gestão começou forçando um grande choque de gestão (com o perdão do trocadilho). Agora temos um diretor técnico profissional no comando, o qual é responsável (atenção para essa palavra) não apenas pela escolha do treinador, mas também do modelo de jogo e da própria montagem do elenco.

Adianto que gosto desse formato e inclusive o acho, teoricamente, o mais adequado para o Flamengo. Digo isso, recorrendo a uma "metáfora biológica", porque, se considerarmos o contexto continental das três Américas, o clube seria um "superpredador" ou o "apex predator", por ser mais rico e uma das camisas mais pesadas; contudo, se estendermos o cenário para todo o futebol mundial, o Mais Querido desce cerca de duas prateleiras e passa a ser um "predador intermediário", sujeito a virar jantar dos tops da Europa e do Mundo Árabe.

Neste ponto entra a complexidade de se planejar uma temporada. Como o nosso calendário não é sincronizado com o europeu, no meio da temporada todo e qualquer clube das Três Américas, inclusive o Flamengo, está sujeito a perder atletas ou mesmo o seu treinador. Enxergo na existência de um diretor técnico responsável pelo modelo de jogo um mecanismo de defesa importante contra eventual predação europeia ou árabe (mais recente). Perde-se um indivíduo, por mais importante que seja, mas a coletividade permanece viva.

É bom frisar que já fomos felizes com outro formato. O presidente Bap costuma dizer que o Mister Jorge Jesus é um combo de diretor técnico e treinador, um tipo de profissional raro, cobiçado e, por isso mesmo, muito valorizado no mercado. E como criticar o trabalho feito entre 1º de junho de 2019 e 17 de julho de 2020?

Ainda assim, não tenho segurança para dizer se o formato funcionaria tão bem nos dias de hoje. No cenário de 2019/2020, o Flamengo tinha mais dinheiro e um treinador/diretor técnico muito acima da maioria dos rivais (como treinador, sofria a concorrência de Jorge Sampaoli). Hoje, a distância financeira ainda existe em relação à maioria, mas existe a (forte) concorrência, no mínimo, do Botafogo de John Textor (Eagle Football).

Não tenho dúvida de que o treinador Jorge Jesus continua sendo absolutamente acima da média. Neste ponto, não temeria concorrência alguma. Contudo, para exercer a função de diretor técnico acredito que o Mister não teria a facilidade de outrora. Com mais gente gerindo bem o dinheiro para investir, inclusive em nível de proteção contratual, e cada vez mais concorrência no mapeamento de mercado, com analistas de desempenho e especialistas em scouting, não seria tão fácil arrancar jogadores dos adversários.

Voltando ao cenário da capital paulista, temos um exemplo atual de como é difícil para um grande treinador ser também um diretor técnico de mesmo patamar. Essa recente matéria do site Trivela, que aborda a quantidade de contratações fracassadas do Palmeiras, traz luzes para um tema que venho recorrentemente tratando com amigos e já trouxe para o nosso Blog em meados de janeiro, no post Ainda o Calendário e as Escolhas, relacionado com a diferença de patamar entre o treinador e o diretor técnico Abel Ferreira. Vejam o que escrevi na época:

Naturalmente, neste Blog conversamos diariamente sobre o Flamengo e não damos tanta atenção a outros clubes, mas o próprio caráter "sangrento" da sequência de jogos contra o Palmeiras naquele agosto/2024 mostra que a Diretoria do Mais Querido não vem sendo a única a priorizar as copas.

Observem que ninguém na mídia dá um pio sobre o assunto, mas o Palmeiras, o maior rival do Flamengo no cenário nacional desde a segunda metade da década passada até hoje, vem priorizando as Copas pelo menos desde 2020, com Abel Ferreira, porém, ao mesmo tempo e pelo menos no último triênio, vem fracassando de maneira retumbante.

O bicampeonato brasileiro do Palmeiras (2022/2023) esconde: a) que a última copa vencida pelo clube foi a Libertadores/2021 (infelizmente sobre o Flamengo); b) a eliminação na terceira fase para o CRB da Copa do Brasil/2021; c) a eliminação para o Athletico/PR na semifinal da Libertadores/2022; d) a eliminação para o São Paulo nas oitavas de final  da Copa do Brasil/2022; e) a eliminação para o Boca Juniors na semifinal Libertadores/2023; f) a eliminação para o São Paulo nas quartas de final da Copa do Brasil/2023; g) a eliminação para o Flamengo nas oitavas de final da Copa do Brasil/2024 e h) a eliminação para o Botafogo nas oitavas de final da Libertadores/2024.

Observem que essa sequência trienal (2022-2024) de fracassos pode ensejar um interessante debate sobre a qualidade e a eficiência do Departamento de Futebol do Palmeiras, inclusive o tamanho do seu badalado treinador como liderança técnica no setor, especialmente no mapeamento do mercado e na montagem de elenco, além da estruturação e rodagem do time durante a temporada. Porém, ainda que instigante, esse debate ficará para outra ocasião.

Hoje, meu objetivo é bem mais simplório: quero falar sobre como o Palmeiras priorizou as copas nesses anos todos (desde 2020, como ia dizendo) e vem fracassando nos últimos 3 anos. Nos dois primeiros (2022 e 2023), foi possível correr atrás do Campeonato Brasileiro, do mesmíssimo jeito que o Flamengo já havia feito em 2020. Em 2024, todavia, um histórico Botafogo frustrou o sonho do tricampeonato palestrino.

O ponto, evidentemente, não é o Palmeiras, e sim o modelo, o paradigma. Observem que o Botafogo foi com o "freio de mão puxado" enfrentar o Bahia e... vejam só... levou um pé na bunda da Baranga, mas terminou a temporada com os dois títulos mais importantes - a Patroa e a Princesa.

Naquela ocasião, o contexto era a priorização de competições no calendário e por isso não me aprofundei no tema da dicotomia Abel Ferreira treinador x Abel Fereira diretor técnico. Hoje é dia de fazer o inverso: deixar de lado o tema da priorização de competições e do calendário e debater o formato diretor técnico e treinador na mesma ou em diferentes pessoas.

Não tenho dúvida que o fracasso do Palmeiras em todas as copas que disputou e priorizou a partir de 2022 até 2024 (3 temporadas, portanto) está diretamente relacionado, ainda que não como causa exclusiva, com o fato do diretor técnico Abel Ferreira não estar nem próximo do patamar do (ótimo) treinador Abel Ferreira.

Para além disso, ainda há o já referido (logo acima) e difícil cenário de cada vez mais competitividade em nível de gestão administrativa e financeira, e também de mapeamento do mercado de atletas com técnicas como análise de desempenho e scouting.

Volto então ao tema do formato. Gosto muito da metodologia hoje adotada no Flamengo, já muitas vezes referida por José Boto, de trabalhar com um "scouting de treinadores" e atrelar a definição de modelo de jogo com as contratações e a escolha do treinador. Se um superpredador europeu ou árabe levar o treinador, em tese será possível continuar o trabalho com alguém de perfil semelhante, evitando também bruscas mudanças na forma de jogar e contratações de atletas de difícil encaixe em um sistema tático.

Tudo isso, evidentemente, é teoria. Na prática, o diretor técnico precisa ser do nível de um "treinador top" ou do contrário é melhor deixar na mão de um "combo diretor técnico + treinador" eficiente, se esse profissional estiver disponível no mercado.

Enfim, a bola precisa entrar. Isso aqui é Flamengo e vencer, vencer, vencer é a diretriz inegociável. São muitos os desafios para um formato dar certo na prática e acredito que a atual gestão juntou sorte com competência na decisão de manter o treinador Filipe Luís. 

Aliás, penso que, a rigor, o formato será testado mesmo à vera quando for necessário substituí-lo. O Flamengo é um clube singular, com muitas particularidades, dentre elas a enorme pressão, que está no DNA do clube. Logo, não é qualquer treinador que consegue se adaptar a esse contexto. Nunca será apenas uma questão de números.

Existem também questões atuais a serem debatidas. Tenho algumas dúvidas em relação a decisões que foram tomadas até aqui pela dupla José Boto e SuperFili. Contudo, hoje a discussão ficará na teoria e no formato. 

No decorrer da semana abordarei algumas escolhas na formatação do elenco e, é claro, a semifinal contra o Vasco da Gama.

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A palavra está com vocês.

Uma ótima semana pra gente.

Bom dia e SRN a tod@s.