segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Os Ídolos Rubro-Negros e seus Ciclos

 

Salve, Buteco! Foi um final de semana de despedidas emocionantes. Enquanto o Velho Lobo nos deixou e partiu para outro plano, Everton Ribeiro e Rodrigo Caio, de maneira muito respeitosa, despediram-se do Flamengo e da Nação Rubro-Negra com vídeos carinhosos nos quais reconheceram e agradeceram o ganho que tiveram na relação com o clube e a torcida.

O caso de Everton Ribeiro teve contornos especiais, pelo caráter familiar que marcou a sua relação com o Mais Querido. Quando chegou em 2017, o Mago e sua esposa Marília Nery ainda não haviam tido filhos, os quais, no decorrer dos 6 (seis) anos de vínculo com o Flamengo, nasceram nas pessoas dos adoráveis Augusto (Guto) e Antônio (Totói), cujas manifestações rubro-negras desde a mais tenra idade criaram um vínculo especial com a Nação.

Em uma sociedade cada vez mais materialista e individualista, a celebração de forma tão nobre de um ciclo que se encerra no mundo do futebol é algo muito raro, ao menos no Brasil, e por isso deve ser enaltecida. 

O torcedor rubro-negro também pode se orgulhar se recordando do passado, pois os tempos parecem mesmo ter mudado, já que o encerramento de ciclos com seus ídolos nem sempre foi tranquilo ou com perda do status por parte do atleta.

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Em 1969, em uma transação feita em sigilo feita pelos presidentes Veiga Brito, do Flamengo, e Reinaldo Reis, do Vasco da Gama, no sábado de Carnaval, alcançando o valor recorde para o futebol Brasileiro de Cr$ 500 mil, o ponta direita Luís Carlos "Tatu", cria das categorias de base, deixou a Gávea rumo a São Januário, levando a torcida rubro-negra à loucura. 

Revista Grandes Clubes Brasileiros

Ao Globo, no dia 29.7.1989 (pág. 27), quando o cruz-maltino já se preparava para receber Bebeto, o ex-ponta direita visitava a Gávea e contava que "praga rubro-negra pega":

"No primeiro jogo que fiz pelo Vasco, contra a Seleção da União Soviética, fui atingido por um zagueiro e tive um problema no pé direito. O jogo seguinte foi contra o São Cristóvão e fui atingido no mesmo local. Então, não houve jeito e fiquei um ano parado."

E no primeiro jogo que disputou contra o Mais Querido, foram marcados dois pênaltis contra o Flamengo. No primeiro, Luís Carlos disse que cobrou mal, porém converteu a penalidade; mas no segundo... perdeu e foi massacarado... por ambas as torcidas!

Diz a sabedoria popular que tatu não sobe em árvore. Não preciso dizer que a Nação Rubro-Negra jamais viu esse Tatu da mesma maneira.

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Tita comemora o gol marcado sobre o Flamengo, que deu
o título de campeão carioca de 1987 ao Vasco da Gama

Tita, craque rubro-negro imortalizado  por integrar o maior e melhor time da História do Flamengo, não ostenta mais o status de ídolo da Nação Rubro-Negra. O cria da Gávea, que nunca se conformou por não ter o mesmo reconhecimento dado a Zico, reclamava que jogava "fora de posição", na ponta direita, motivo que o levou a recusar integrar a Seleção Brasileira de 1982 (!).

Seis meses depois, desentendendo-se com o treinador Paulo César Carpegiani no final do ano, transferiu-se para o Grêmio, onde ficou um semestre e foi campeão da Libertadores. Contudo, com a negociação de Zico para a Udinese, foi repatriado para, finalmente, vestir a camisa com a qual tanto sonhava. No início, as coisas correram bem e o Mais Querido conquistou a Taça Guanabara, mas o desfecho do campeonato, com o título do Fluminense, trouxe decepção.

Vieram as vaias e a volta de Zico, devolvendo-o para a ponta direita. Para piorar, o "Doutor" Sócrates também havia chegado com vaga cativa na meiuca. Ao se transferir para o Internacional, um Tita magoado deixou o clube, bradando "Flamengo nunca mais"

Contudo, o divórcio com a torcida só viria mesmo com a transferência para o Vasco da Gama e o gol do título em 1987, o que tornou Tita o herói "menos querido" de 1981.

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Júnior supera Bebeto durante a vitória rubro-negra por 2x0 pelo
Campeonato Brasileiro de 1989, o "Jogo do Bujica" ou "Bujicaço!

Bebeto já foi ídolo do Flamengo, isso é fato. Numa época em que a torcida vaiava sem dó, com muito mais ímpeto e menos tolerância do que atualmente, volta e meia receba as suas vaias pelos gols que perdia, porém nenhum torcedor negava seu talento e, especialmente após os títulos carioca de 1986 e Brasileiro de 1987, no qual foi decisivo na reta final, ganhou novo status e era um craque de Seleção Brasileira.

A transferência de Bebeto para o Vasco da Gama não surgiu do nada. O finado Gilberto Cardoso Filho, presidente do Flamengo, disse-lhe na cara que "não valia U$ 200 mil", o que fez o jogador se sentir humilhado, ainda mais porque, antes, já lhe havia sido negado um adiantamento para que pudesse comprar uma casa.

O Baianinho, porém, errou na dose. A transferência para um arquirrival do Rio de Janeiro, com direito a aliciamento, na Granja Comary, pelo também finado vice-presidente de futebol Eurico Miranda, então diretor da Seleção Brasileira na CBF, custou o carinho da Nação Rubro-Negra.

Ele bem que tentou consertar, voltando ao Flamengo. Terminou com fama de traíra por ambas as torcidas. Nada mais deu certo.


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Houve, porém, um ciclo que tinha tudo para terminar mal ou perdendo a magia, e que, por obra dos Deuses do Futebol, terminou como um conto de fadas - para a torcida do Flamengo.

Recentemente, Dejan Petkovic contou ao canal de Rafael Cotta as agruras que passou antes da final de 2001 contra o Vasco da Gama. Com atraso de salários que chegava a 8 (oito meses), o pagamento de apenas 2 (dois), não cumprido às vésperas do jogo decisivo, tirou-lhe do sério.

O Sérvio encheu a cara e foi chamado por Zagallo para uma conversa na manhã seguinte. O Velho Lobo lhe perguntou se estava ciente de que, se o Flamengo perdesse a final, ele seria o responsável. Com a resposta afirmativa, e a compreensão e o apoio do grupo, foi escalado.

O resto é História.

Pet ainda jogaria pelo Vasco da Gama, sendo campeão da Taça Guanabara, da Taça Rio e, consequentemente, do Estadual de 2003, e pelo Fluminense, onde não conquistou títulos, mas desfilou com exibições de alta categoria. Até que... numa dessas reviravoltas que só o mundo da bola proporciona, voltou ao Flamengo, e para fazer História.

Sua contratação, decidida pelo presidente Delair Dumbrosck para composição de dívida, provocou (ou foi utilizada como pretexto) para o rompimento do vice-presidente de futebol Kleber Leite, substituído por Marcos Braz.

E como eu ia dizendo, o resto é História.


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Eu ainda poderia falar de Renato, Romário e alguns outros, mas acho que já está bom para hoje. O Mago nos deixou definitivamente, como atleta, mas só o futuro dirá se ostentará a condição de ídolo. Tanto ele, como sua esposa Marília, tiveram uma atitude grandiosa na despedida, porém só os caminhos da bola desenharão o futuro da relação com o clube.


Ao Mago, boa sorte, menos contra o Flamengo; ao De La Cruz, que deverá herdar a sua camisa 7 e o lugar no time, toda boa sorte (sem ressalvas!), e a quem ainda está por renovar, uma dica: o Flamengo de hoje não é mais o mesmo que maltratou Bebeto ou ficou devendo a Renato, Romário e Petkovic. Muito cuidado com os caminhos da bola...

A palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.