Resiliência
substantivo feminino
- 1.FÍSICApropriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica.
- 2.FIGURADOcapacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças.
Salve, Buteco! Com 54 anos de idade, posso afirmar a vocês que sou Flamengo desde antes da Geração Zico, quando o Galinho de Quintino já vestia a Camisa 10 do Mais Querido, porém antes daqueles jogadores que viriam a formar o melhor time da História do Clube conseguirem se firmar como titulares. Eram tempos de Maestro Júnior ainda na lateral direita (quanto Toninho não jogava), Merica ou Dequinha na cabeça-de-área, Júnior Brasília e Luiz Paulo nas pontas, Luisinho Tombo no comando do ataque; tempos nos quais o Mais Querido era considerado um clube grande no cenário nacional, porém ainda não havia conquistado um título oficial importante que não fosse o Estadual ou dentro do circuito Rio-São Paulo.
Então, posso dizer que já vivi o melhor, o pior e o mediano. Vi a decadência do clube após o fim da Geração Zico, os "anos de chumbo" e fugas do rebaixamento, o fim do jejum de títulos Brasileiros e o nascimento da Chapa Azul e da reconstrução do clube. Como gosto de estudar a História do clube, arrisco dizer que o período de menor competitividade do futebol foi o dos 6 primeiros anos do Século XXI, anos das dramáticas fugas do rebaixamento.
Antes disso, puxando pelas pesquisas sobre a História do clube, acredito que o período mais complicado tenha sido o da década de 60, tempos nos quais o futebol brasileiro era dominado pelo Santos de Pelé e a Academia do Palmeiras, coadjuvados por duas boas gerações do Botafogo e o primeiro supertime do Cruzeiro.
Contudo, apesar do que vivenciei no início do Século XXI, antes de 2023 (só nasci em 1969) o ano no qual senti maior desânimo havia sido 1994, quando, antes do início da gestão Kleber Leite na Presidência do clube, o Flamengo terminou muito mal a temporada e o Campeonato Brasileiro.
A goleada sobre o Corinthians na primeira fase, com show de Sávio e Magno, passou a impressão de que o time poderia engrenar no campeonato, com os crias da base se consagrando no profissional. Os números também permitiam ter esperança, pois o time ficou em segundo lugar no Grupo A (4v [2 pontos], 4e e 2 d em 10 jogos).
Na segunda fase, todavia, o time despencou de rendimento, veio a eliminação para o Estudiantes na Super Copa e uma campanha desapontadora até mesmo para o menos otimista dos torcedores, ficando em penúltimo (7º) lugar no Grupo F, com 4 pontos em 7 jogos (1v [2 pontos], 2e e 4d), num bizarro 15º lugar no certame nacional.
Aos 10 de janeiro de 1995, porém, o ânimo da torcida mudaria completamente quando o novo presidente anunciou a contratação do melhor jogador do mundo na época, o baixinho Romário. 1995, Ano do Centenário, começava promissor, porém terminaria como uma enorme decepção, especialmente pela derrota na finalíssima do Estadual para o Fluminense, com o gol de barriga de Renato, ex-ídolo do clube.
Ainda assim, o espírito era outro. Havia indignação e cobrança sobre o presidente para que o desempenho do time melhorasse, cenário completamente diferente do final da temporada/1994, quando a gente olhava para o horizonte e não enxergava a menor perspectiva de melhora. A contratação de Romário resgatou a autoestima do torcedor.
Sendo muito sincero com vocês, estou mais desanimado do que naquele dezembro de 1994 e, em razão disso, hoje consigo entender o torcedor mais jovem, que não viveu todos esse períodos de vacas magras, quando afirma que 2023 foi o pior ano do clube. É que, quando o Flamengo se salvava do rebaixamento com um milagre do Papai Joel, um gol do Obina ou de El Tigre Ramírez, havia mobilização da torcida em torno da sobrevivência na Série A, além da força da esperança por dias melhores na gestão do clube.
Esse Flamengo bilionário, mas sem tesão por vitórias e títulos, para o qual tanto faz ser campeão, vice ou se classificar para o G4; o Flamengo do conforto para dirigentes, atletas e seus empresários; o Flamengo da acomodação e dos autoelogios pelos títulos conquistados entre 2019 e 2022; o Flamengo da torcida que faz selfie no Maracanã e bate palmas para o time depois de ser goleado pelo Atlético Mineiro no Maracanã, e que coloca jogador acima do clube, esse Flamengo não me representa e, moralmente, acredito que seja muito pior do que o que terminou a temporada de 1994, o que deu vexame no Centenário do clube (1995) ou o que fugiu do rebaixamento entre 2000 e 2005, e em 2010 e 2012.
O noticiário dá conta de que o excelente jogador uruguaio Nicolás De La Cruz está perto de ser anunciado. Ainda que eu seja um entusiasta da contratação, não consigo me entusiasmar com o Flamengo de hoje. Talvez um bom trabalho do Tite consiga reverter esse quadro, mas por enquanto prevalece a perda de confiança na Diretoria e o elenco. Como esperar algo de muito diferente se os gestores são os mesmos?
De qualquer modo, a mensagem do texto de hoje não é de desânimo, mas de lembrar que, enquanto dirigentes, atletas e treinadores passam, a torcida fica e não abandona o Mais Querido. E nós, aqui no Buteco, seguiremos juntos, sabendo que um dia essas pessoas passarão e o autêntico Flamengo retornará.