segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Alhos, Bugalhos e o que Não é nem Um nem Outro


Salve, Buteco! No final do ano passado subi uma sequência de posts sobre a História da Copa Intercontinental, antiga versão do Campeonato Mundial de Clubes, e para mim cada post da série teve seus próprios significado e importância. No quarto e último dos posts, intitulado O Mundial de Clubes - 4ª Parte - A Lei Bosman, o Fim da Intercontinental e o Mundial de Clubes da FIFA, tentei explicar, sob o ângulo dos clubes, como via o processo histórico que levou o futebol brasileiro a perder competitividade no cenário internarcional.

O tema é muito rico e pode ser analisado por diversos ângulos, e um dos que acho mais relevantes é o da formação dos treinadores brasileiros, comparado com os estrangeiros. Tenho para mim que a CBF jamais deu maior importância ao tema, o que ajuda a explicar a quantidade cada vez maior de treinadores estrangeiros dirigindo clubes da Série A do Campeonato Brasileiro.

Quando o tema é analisado sob o ângulo da Seleção Brasileira, ao menos aos meus olhos o processo de decadência fica ainda mais claro, assim como uma de suas principais causas: o negacionismo, o qual, por sua vez, se não for "filho", foi "criado e educado" pela arrogância. A entidade sempre sentou em cima dos 5 títulos mundiais brasileiros. Depois da sucessão de fracassos pós-título de 2002, um primeiro passo foi dado, com a tentativa de contratar o mítico treinador italiano Carlo Ancelotti.

Contudo, além de ser um movimento por demasiado tímido, haja vista que parece ter finalidade meramente imediatista, qual seja, dar competitividade ao escrete canarinho - e, portanto, não representar qualquer avanço na estrutura de formação dos treinadores brasileiros -, um outro setor importante do meio despeja histórica e cotidianamente toneladas de negacionismo e arrogância no trato do tema: o jornalismo esportivo brasileiro.

Vejam bem, não é de hoje, mas no mínimo há 4 (quatro) anos (2020/2023) que elogio o trabalho do treinador Fernando Diniz (12 e 3) e, portanto, sinto-me absolutamente a vontade para observar que bastou uma goleada sobre a Bolívia na primeira rodada das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2026, e repetindo a escalação do Tite, para a tropa do ufanismo patológico bradar aos quatro ventos que está em curso uma revolução que resgatará todo o valor do futebol brasileiro.

O post de hoje não tem por objetivo se aprofundar no tema, mas apenas mostrar como está presente na maneira pela qual o jornalismo esportivo brasileiro trata os treinadores estrangeiros que trabalham no Flamengo. A impressão que tenho é que a cultura anti-Flamengo, cada vez mais forte e presente, mistura-se com o negacionismo e a arrogância futebolística tupiniquim, formando um cenário absolutamente hostil para os treinadores gringos do Mais Querido.

A primeira vez que me deparei com o fenômeno foi na passagem de Reinaldo Rueda, em 2017. Em seguida, Jorge Jesus também foi duramente atacado, mas o Ano Mágico (2019) e a excelência de seu trabalho prevaleceram. Com Domènec e Paulo Sousa aconteceu algo semelhante, mas curiosamente em menor intensidade, o que me leva a desconfiar que a proporção que a hostilidade toma é diretamente ligada ao "tamanho" do treinador e ao seu pontecial de efetivamente melhorar o desempenho do Flamengo.

Com Vítor Pereira e Jorge Sampaoli, contudo, a gritaria tomou proporções que vão muito além dos limites da histeria. O "Genro", é bem verdade, teve o fator complicador da saída mal conduzida do Corinthians, o que levou à patrulha paulista tomar à frente da campanha para derrubar o luso do comando do Mais Querido. Campanha essa que acabou por ser bem-sucedida, convenhamos. É claro que problemas internos do clube e erros do próprio treinador tiveram maior importância, porém desde o início o clima criado em torno da chegada do Genro foi um importante e primeiro passo para tudo dar errado.

É nesse ponto que gostaria de lançar algumas breves palavras sobre o nosso atual treinador, Jorge Luis Sampaoli Moya, vulgo "Careca".

Confesso a vocês que não acreditava que veria uma perseguição tão grande quanto a que Reinaldo Rueda sofreu, porém, perplexo, devo reconhecer que a nossa "imprensa escrotiva" conseguiu piorar. A campanha é absolutamente abjeta e vem de todos os lados, desde "análises" pré, durante e após as transmissões, até em matérias diárias na cobertura do dia-a-dia rubro-negro.

É claro que constatar essa obviedade não transforma o Careca em uma simples vítima e nem autoriza que a perseguição se torne uma muleta para os erros que até aqui foram cometidos. O ponto é que, se não podemos comparar o trabalho do argentino a um Cláudio Coutinho ou a um Jorge Jesus, tampouco é minimamente razoável sustentar que seja caso de demissão ou de um trabalho dos piores já desenvolvidos no clube.

Os  números não mentem: o aproveitamento de 67,9% está longe de ser ruim, dada a média histórica de aproveitamento dos treinadores do Flamengo, especialmente se o percentual for analisado dentro do contexto que lhe é próprio, qual seja, de calendário "cheio" e somente disputando as 3 maiores competições do ano - Campeonato Brasileiro, Copa Libertadores da América e Copa do Brasil. Copa do Brasil, ressalte-se, competição cuja final o Mais Querido começará a disputar semana que vem, com concretas chances de título, e na qual o Careca dirigiu o time em todos os jogos, à exceção da estreia.

Sem prejuízo de outros problemas, a gestão de grupo pode ser questionada, (na minha opinião) nem tanto a questão do trato (ser comunicativo ou não), mas como em determinados momentos "escanteou" alguns jogadores (e ainda o faz com outros); a saída de bola já apresentou muitos problemas (foi melhorar no último jogo, contra o Botafogo), e a leitura de jogo, em muitas partidas, mostrou-se desastrosa, tendo por exemplo máximo o trágico segundo tempo contra o Olimpia em Assunção, pela Libertadores.

Mas há consideráveis fatores positivos. Se o Flamengo foi competitivo na temporada 2023, isso se deveu ao choque de métodos implantado por Jorge Sampaoli. Se é verdade que a coisa em alguns momentos fugiu ao controle, não menos verdade é que a História do clube é bem mais rica em exemplos de treinadores que sucumbiram em meio a crises tão fortes do que os que sobreviveram.

E o trabalho de Jorge Sampaoli até aqui, Amigos, é de sobrevivência em uma das temporadas mais desastrosas da História do clube, com direito a eliminação vexatória na semifinal do Mundial de Clubes, derrota para clube equatoriano em final de torneio internacional em pleno Maracanã e goleada por 1x4 em finalíssima de Estadual, diferença de gols que não ocorria desde 1962 (0x3 Botafogo), ou seja, há 61 (sessenta e um) anos.

Na minha opinião, o contexto pesa muito em favor do argentino e gostaria de sugerir a quem me dá a honra de ler os meus textos que reflita sobre o assunto na semana em que o Flamengo iniciará uma histórica decisão de Copa do Brasil contra o São Paulo. Dorival fez História no Flamengo, é merecidamente uma figura querida no clube (elenco e funcionários) e na torcida, mas hoje é nosso adversário.

O treinador da ocasião se chama Jorge Sampaoli e é ele que estará à frente do time nesses duríssimos confrontos, o que justifica que receba todo o apoio da Nação Rubro-Negra.

Convém à torcida que saiba separar alhos de bugalhos, bem como diferenciar o que não é uma coisa nem outra, mas que pode, ao final, revelar-se um trabalho vencedor em um ano tão difícil.

A palavra está com vocês.

Bom die SRa tod@s.