Saudações flamengas a todos,
E, enfim, Sampaoli “chegou
chegando”. Se é verdade que derrotar o inexpressivo Maringá FC no Maracanã,
mesmo revertendo uma desvantagem de dois gols, não é uma façanha das mais notáveis,
também é inegável que a forma como o Flamengo mastigou e espatifou o oponente, voltando
a marcar, após longo hiato de 28 anos, 8 gols em uma partida, traz alento e
esperança para a sequência da temporada. Fujo à tentação de imaginar como se
comportaria o caricato time sob o treinador (oi?) anterior, se posto diante do mesmo
desafio.
De qualquer forma, agora terá
início uma sequência particularmente dura, com muitas viagens e jogos "pegados",
que exigirão bastante da equipe. A começar pelo jogo de domingo, contra o
Botafogo, clássico regional sempre escamado. Aproveitando, segue a série “Caminhos
da Bola”, agora listando alguns jogadores que, identificados com o rival, chegaram
ao Flamengo. Uns prosperaram na Gávea. Outros, nem tanto. É o que se vai contar
a seguir.
SÉRIE “CAMINHOS DA
BOLA”
IV
FLAMENGO - BOTAFOGO
UBIRAJARA MOTTA (1972-1977)
Goleiro com passagem destacada no
Bangu, onde conquista o Campeonato Carioca 1966, transfere-se para o Botafogo
em 1968, fazendo parte do processo de renovação do elenco alvinegro. Em General
Severiano, conquista uma Taça Brasil e um Carioca, ambos em 1968, mas acaba involuntariamente
marcado ao se chocar com um atacante do Fluminense no lance do gol que dá ao
tricolor o Carioca 1971, num lance que até hoje o Botafogo chora a não marcação
de falta. De qualquer forma, a traumática perda desse título (em que o alvinegro
detinha larga vantagem sobre os adversários) abrevia a passagem de alguns atletas,
entre eles Ubirajara Motta, que se transfere para o Flamengo no início do ano
seguinte. No rubro-negro, precisa disputar posição com o outro Ubirajara (Alcântara,
o que marcou o gol contra o Madureira dois anos antes) e com Renato, que acaba
escolhido titular. Como coadjuvante, Ubirajara participa das conquistas dos
Cariocas de 1972 e 1974, e permanece sendo opção no elenco até se aposentar, em
1977.
JOSIMAR (1989-1990)
Emerge da base do Botafogo, e
desde cedo mostra talento, com seu futebol de grande vigor físico, velocidade e
um chute particularmente forte e certeiro. Mas, com o alvinegro vivendo um dos
piores momentos de sua história, Josimar não consegue fazer decolar sua
carreira, o que só acontece em 1986, após a incrível sequência de
acontecimentos (desistência de Leandro em viajar e lesão/barração do titular
Edson) que o coloca como titular da Seleção Brasileira no terceiro jogo da Copa
do Mundo. Marca neste e no jogo seguinte dois gols de placa que o colocam como
um dos principais laterais do futebol brasileiro. Permanece no Botafogo até
1989 (após fugaz passagem pelo futebol europeu), onde conquista o Estadual após
longo jejum. Mas seus recorrentes problemas disciplinares, já quase
incontroláveis, apressam sua transferência para o Flamengo, no mesmo ano. No rubro-negro,
as sucessivas faltas e atrasos a treinamentos, aliados aos constantes incidentes
extracampo em que se envolve, impedem que consiga manter uma sequência
aceitável de jogos. Sistematicamente barrado e sem espaço, é negociado com o Internacional,
ainda no ano de 1990. Encerra a carreira em 1997, após rodar pelo Norte do
país.
WILSON GOTTARDO (1991-1993)
Forma, com Ricardo Rocha, a zaga
do inesquecível Guarani de 1985-1986, que por pouco não conquista o Brasileiro.
Em 1987, transfere-se para o Botafogo, onde rapidamente conquista a torcida,
com seu futebol seguro e personalidade forte. Pelo alvinegro conquista os
Estaduais de 1989 e 1990. No entanto, no início de 1991 entra em litígio com a
Diretoria, durante a renovação de seu contrato. O Flamengo, precisando de um
zagueiro e de dar uma resposta à torcida, irritada pela saída de Renato Gaúcho
(que trocou o Flamengo justamente pelo Botafogo), investe forte em Gottardo e
consegue viabilizar a vinda do jogador. Gottardo se encaixa como uma luva,
tornando-se uma das referências do jovem e talentoso elenco que conquista o
Estadual 1991 e o Penta Brasileiro 1992. No meio do ano seguinte, o Flamengo,
imerso em problemas financeiros e com a consolidação da dupla Rogério-Júnior Baiano,
acaba negociando o jogador com o Marítimo-POR. Gottardo ainda retorna ao
Botafogo e atua por outros clubes, encerrando sua bem-sucedida carreira em
1999.
WILLIAN ARÃO (2016-2022)
Revelado no Grêmio Barueri, chama
a atenção defendendo o São Paulo que conquista a Copa São Paulo 2010, o que lhe
vale uma precoce transferência para o futebol espanhol. Em 2015, após discreta
passagem pelo Corinthians (de onde foi sucessivamente emprestado para diversos
clubes), chega ao Botafogo, por onde se destaca na disputa da Série B, conquistada
pelo alvinegro. Valorizado, não chega a um acordo com a Diretoria para a renovação
de seu contrato e consegue na Justiça o direito de se transferir para outro
clube. E esse outro clube é justamente o Flamengo, o que acende forte onda de
inconformismo e ressentimento entre os pares de General Severiano,
especialmente diante do ímpeto que Arão demonstra em consumar essa troca. No
Flamengo rapidamente se torna titular, mas a relação com a torcida vive altos e
baixos. Se por um lado é um jogador muito técnico, dono de ótimo passe, forte
nas bolas aéreas e capaz de infiltrações contundentes, seu comportamento
defensivo, muitas vezes tido como indolente, gera controvérsias. Também não
ajuda o hábito de dar declarações um tanto “sinceras” em excesso, que remetem
ao corporativismo usual do meio. Acaba marcado pelas frustrantes temporadas de
2017 e 2018, e parece viver o final do ciclo no Flamengo, quando, em 2019, Jorge
Jesus chega ao clube e elege Arão como peça-chave do sistema defensivo. Dá
muito certo, e Arão vira um ponto de equilíbrio da equipe que conquista praticamente
tudo sob o comando do luso. Em 2021, já sob Rogério Ceni, chega a ser deslocado
para a zaga, mantendo-se importante. Mas, em 2022, cai de rendimento e o
Flamengo o negocia com o Fenerbahçe-TUR, clube que atualmente defende.
CARLOS ALBERTO DIAS/VALDEIR
(1994)
Formam uma dupla que faz história
no Botafogo de 1990 a 1992. Carlos Alberto Dias é um meia baixo, muito habilidoso,
de drible, infiltração e tabelas, que se destaca no Coritiba de 1988-1989. Em
1990 chega a acertar a ida para o Flamengo, mas uma divergência com seu
empresário o leva a General Severiano. Já Valdeir, revelado no Atlético-GO,
chega ao Botafogo em 1989. Jogador extremamente veloz e intenso, recebe o
apelido de “The Flash”, pela facilidade com que bate defensores na corrida.
Pelo alvinegro, conquistam um Estadual e chegam ao Vice Brasileiro 1992
(perdido justamente para o Flamengo). Voltam a se encontrar em 1994, no
Flamengo. Dias chega após uma passagem apagada pelo Grêmio e Valdeir vem
emprestado pelo São Paulo. Mas ambos já vivem um momento de declínio em suas
carreiras e em nenhum momento chegam perto de reeditar o futebol de antes.
Acabam barrados pelos jovens Marquinhos e Sávio, este último em fulminante
ascensão. Ao final do Estadual, Dias é negociado com o Paraná e Valdeir é
devolvido ao tricolor paulista.
BETO (1998-2002)
Apresenta ascensão meteórica no
Botafogo, onde chega em 1994, vindo do modesto Dom Bosco-MT (segundo a lenda,
trocado por algumas dezenas de pares de chuteiras). Torna-se jogador fundamental
na conquista do Brasileiro 1995, o que lhe vale a convocação para a Seleção Brasileira
e uma transferência para o Napoli-ITA. Em 1998, após apagadas passagens pelo clube
italiano e pelo Grêmio, chega ao Flamengo, seu clube de coração, onde logo se
torna importante, com um futebol aplicado taticamente, intenso e consistente,
capaz de ajudar no combate e de chegar à frente para finalizar e criar chances
de gol. Quase sempre como titular, conquista o Tri Estadual 1999-2000-2001, a
Copa Mercosul 1999 e a Copa dos Campeões 2001. Um dos momentos mais lembrados é
a sequência de embaixadinhas que executa na Final do Estadual 2000, em resposta
à provocação vascaína em um jogo anterior. Permanece no Flamengo até 2002 (salvo
um hiato de seis meses em 2000, quando é emprestado ao São Paulo, sem espaço
por causa do pacote de reforços trazidos pela ISL), saindo do rubro-negro em
decorrência da forte crise no período. Encerra a carreira em 2009, após passar
por vários clubes. Como curiosidade, é um dos poucos a terem defendido os
quatro principais cariocas.
IRANILDO (1996-2000, 2002-2003)
“Amanhã iremos anunciar um
jogador de Seleção Brasileira”. O anúncio feito pelo Presidente do Flamengo no
início de 1996 gera um alvoroço de mesma expressão do desapontamento que emerge
ao ser revelado o nome. Com efeito, se o jovem Iranildo é um jogador talentoso
e promissor, soa duvidoso que suas esporádicas convocações à Seleção sejam
suficientes para alçá-lo ao patamar de medalhão. De qualquer forma, o Flamengo
consegue tirá-lo do Botafogo, por onde fez ótimo Brasileiro no ano anterior,
sempre entrando com destaque durante os jogos. Sob o comando de Joel Santana,
ganha a alcunha de “Chuchu”, que ajuda a torná-lo xodó da torcida. Faz bom
Estadual e ajuda na conquista do título invicto. No entanto, as severas
limitações físicas (é baixo e mirrado) impedem que ganhe uma sequência
consistente como titular. Destaca-se no Brasileiro de 1997, quando compõe com
Sávio e Lúcio um trio interessante, leve e insinuante, mas é em 1999 que vive
seu melhor momento, exercendo papel-chave na conquista do Estadual e da Mercosul.
Em 2000, o Flamengo traz Petkovic e outros reforços, e com isso o Chuchu perde
espaço e é negociado com o Bahia. Dois anos depois, após passagem pelo futebol
grego, retorna ao Flamengo mas sem o brilho esperado, até em função do péssimo
momento do clube. Em 2003, transfere-se para o Brasiliense, clube pelo qual
ganha identificação e encerra a carreira, dez anos depois, após rodar pelo
país.
GARRINCHA (1968-1969)
Ícone do Botafogo e o maior jogador
da história alvinegra, atua por General Severiano entre 1953 e 1965, numa
trajetória que assombra o país, tal o nível desconcertante de suas exibições.
Além do célebre drible imparável, possui um cruzamento preciso e um chute
notavelmente potente e bem colocado, revestindo-se, portanto, em um dínamo de
todo um sistema ofensivo. No seu período áureo (que vai até 1962), conquista,
sempre com papel de destaque, três Campeonatos Cariocas, dois Torneios Rio-São
Paulo e duas Copas do Mundo, pela Seleção Brasileira. No entanto, após a
atuação antológica na Final da Carioca de 1962, tem início seu acentuado
declínio, decorrente do grave problema com bebidas, da vida pessoal atribulada
e das sucessivas infiltrações nos joelhos lesionados que passam a cobrar seu
preço. Quando chega ao Flamengo, no final de 1968, já é uma melancólica sombra
da estrela do passado. Ainda assim, aceita se submeter a um vigoroso
treinamento físico conduzido pelo rubro-negro, cujo resultado é uma atuação de ótimo
nível em sua estreia contra o Vasco, num Maracanã lotado como nos velhos
tempos, que nem a derrota (0-2) mancha. A seguir, atua em alguns amistosos pelo
país, onde sua imagem é utilizada como chamariz, mas volta a exibir
comportamento desregrado e errático, tornando a decair física e tecnicamente. Ainda
assim, é titular no início do Carioca 1969, em que o Flamengo tem bom início,
mas se envolve em um gravíssimo acidente de carro cujos desdobramentos liquidam
sua passagem pelo rubro-negro. Encerra a carreira em 1972, atuando pelo Olaria.
Em 1983 tem fim sua longa agonia, e o Mané se torna o anjo torto das memórias
de todo um país.
DIMBA (2004-2005)
Cria do futebol brasiliense, em
1997 torna-se uma espécie de talismã do Botafogo, ao entrar no decorrer dos
jogos e marcar seus golzinhos. Vive momento de glória ao anotar, contra o Vasco,
o gol que dá ao alvinegro o Estadual, momento em que passa a cultivar a
extravagante mania de mastigar tufos de grama após cada gol marcado. Após sair
do Botafogo, roda por vários clubes e chega a seu auge no Goiás em 2003, quando
se torna o artilheiro do Brasileiro, o que lhe rende uma transferência para o
futebol saudita. No retorno, em 2004, o Flamengo vive grave carência de atacantes,
e protagoniza ferrenho leilão com o São Caetano pela sua contratação, o que acende
forte crise com um elenco irritado com os sucessivos atrasos salariais. Ainda assim,
Dimba é contratado e, mesmo hostilizado por parte do plantel, mostra estrela na
estreia, ao marcar o gol da vitória por 1-0 sobre o São Paulo, no Raulino de
Oliveira. Mas Dimba jamais consegue se mostrar à vontade no Flamengo e os
números razoáveis obtidos em 2004 (que ajudam a salvar o time do rebaixamento)
simplesmente evaporam no caótico início da temporada seguinte. Caro e
improdutivo, é negociado no primeiro semestre de 2005 com o São Caetano, que
enfim consegue contratá-lo. Encerra a carreira em 2015, de volta ao Distrito
Federal.
PAULO CÉSAR LIMA (1972-1974)
Expoente da “nova geração” que surge
no Botafogo no final dos anos 1960, impressiona pela habilidade e a capacidade
de driblar e finalizar, atuando como um “camisa 10” completo, mas também capaz
de atuar deslocado pela esquerda, como falso ponta. Irrequieto e de
personalidade forte, não demora a se tornar destaque do alvinegro, por onde
conquista dois Cariocas e uma Taça Brasil. Ganha o apelido de “Caju” ao pintar
os cabelos de vermelho para se posicionar em uma questão política. É um reserva
bastante utilizado por Zagalo na conquista da Copa do Mundo de 1970, e, no ano
seguinte, já é o principal nome de um Botafogo que parece que irá conquistar
com tranquilidade o Carioca. Mas a perda traumática do título o estigmatiza e,
em desgraça, é vendido ao Flamengo no final do ano. Encaixa como uma luva no
rubro-negro, onde reencontra Zagalo. Mordido, faz brilhante Carioca em 1972,
que o Flamengo conquista em campanha indiscutível. No ano seguinte perde foco,
mas ainda é importante, sendo nome certo como titular da Seleção Brasileira que
irá ao Mundial do ano seguinte. No início de 1974, participa de uma excursão
pelo Brasil, e a seguir se apresenta à Seleção. Após a Copa, acerta sua saída
para o Olympique-FRA. A venda de Paulo César abre, definitivamente, espaço para
a consolidação do espaço do jovem Zico, que a essa altura já é irreversível.
VITINHO (2018-2022)
É num jogo válido pelo Estadual
Sub-17 que, em 2010, Vitinho impressiona Dirigentes do Botafogo, após maltratar
o alvinegro atuando pelo Audax. Logo troca de ares, e, após dois anos na base
de General Severiano, estreia em 2013, já mostrando ótimo nível e sendo
importante na conquista do Estadual do mesmo ano. Segue um atacante insinuante
e perigoso ao longo do ano, e a boa campanha no Brasileiro (que leva o Botafogo
à Libertadores) lhe vale uma transferência para o CSKA-RUS. Em 2018, após longo
namoro, o Flamengo enfim consegue repatriar o jogador, mas o alto valor da
transferência e a responsabilidade de substituir o ídolo Vinícius Jr trazem uma
pressão com a qual o retraído e discreto Vitinho possui grande dificuldade de
lidar. Apesar dos bons números de gols e assistências, é sempre lembrado por
gols perdidos e por atuações apagadas em jogos importantes. Sua postura um
tanto indolente também não ajuda a criar identificação com a torcida. Ainda
assim, vive bons momentos. Marca os gols que dão ao Flamengo os títulos
Estaduais de 2019 e 2020. No ano de ouro de 2019, termina, mesmo como reserva,
como o quarto artilheiro da equipe, atrás apenas do trio Gabigol-Bruno Henrique-Arrascaeta.
Nas temporadas seguintes, segue como um reserva de bons números, mas incapaz de
engatar uma sequência que ameace os titulares ou conquiste a torcida. Até que,
em 2022, volta de lesão atuando mal tecnicamente, passando a ser perseguido com
vaias cada vez mais intensas. Clube e jogador percebem, assim, que o ciclo
chegou ao fim, e Vitinho é negociado com o Al Ettifaq-ARA, seu clube atual.
Links capítulos anteriores:
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Parte II: Flamengo – Fluminense
Parte III: Flamengo –Internacional