Saudações flamengas a todos,
Costumo dizer que Papai do Céu
foi bom comigo quando me colocou no mundo tatuado com as cores rubro-negras. E,
após a glória eterna de Guayaquil, pus-me a pensar no que vivi, no que senti e
onde estava em algumas das outras grandes conquistas que tive a felicidade de
ver o Flamengo alcançar. E é o que vai descrito nas próximas linhas.
E os amigos? Onde estavam quando
o Flamengo foi campeão? Lembram?
* * *
TRICAMPEONATO ESTADUAL 1979 –
FLAMENGO 3-2 VASCO
O início da lista não poderia
começar com outro jogo que não fosse o que marcou o primeiro título acompanhado
ao vivo. Passei a semana toda na expectativa da transmissão, anunciada
sistematicamente em chamadas de TV. Do jogo, eu me lembro da tensão provocada
pelo empate dos caras após o Flamengo abrir 2-0 e da festa com o gol salvador
de cabeça de Tita. Drama e sofrimento já na primeira taça, no alto dos meus 7
anos, aprendendo desde cedo o que é Flamengo.
(em tempo: o tri foi matematicamente
confirmado com a vitória do Vasco sobre o Fluminense por 3-2, na rodada
seguinte, e o Flamengo entrou em campo já campeão contra o Botafogo, em jogo
que terminou 0-0. De qualquer forma, a vitória sobre o Vasco já havia dado virtualmente
o título para o Flamengo, e a torcida saiu do Maracanã gritando “é campeão”)
CAMPEONATO BRASILEIRO 1980 –
FLAMENGO 3-2 ATLÉTICO/MG
Se o jogo do tri de 1979 foi
sofrido, as finais de 1980 me levaram ao limite. Saí chorando revoltado após o
jogo do Mineirão, clamando por revanche. No jogo final, o gol de Nunes no
comecinho me fez gritar tanto que quase tive um treco. Enquanto tomava água com
açúcar, veio o empate e aí mais tensão até Nunes emular Garrincha e tirar uma
espinha da minha garganta. Com efeito, um ano antes, vendo a festa do tri do
Inter, eu perguntara ao meu pai: “Quantos Brasileiros o Flamengo tem?”,
“Nenhum”. Aquilo não tava certo, tinha que mudar. E iria...
COPA LIBERTADORES 1981 – FLAMENGO
2-0 COBRELOA-CHI
Vi todos os jogos daquela
Libertadores pela TV, exceto o 1-1 com o Olimpia, que não transmitiu para
Salvador. Eu usava um “relógio da sorte”, sentava sempre na mesma cadeira,
essas coisas. Nesse terceiro jogo, o sinal da Globo caiu nos minutos iniciais e
quase não mostrou direito o primeiro gol do Zico. Mas eu me lembro de ter sido
um jogo em que não tive medo nenhum da derrota. Perto das finais anteriores,
foi uma partida até “tranquila”. E ri muito com o Anselmo.
MUNDIAL INTERCLUBES 1981 – FLAMENGO
3-0 LIVERPOOL-ING
O grande suspense desse jogo era
saber se eu poderia assistir. Meu pai iria trabalhar em plantão noturno e eu
era proibido de varar a madrugada com a TV, risco de dormir com o aparelho
ligado etc. Após longa e tensa negociação, minha mãe concordou em assistir à
partida comigo. O jogo? Foi mágico. Êxtase no primeiro tempo e uma maravilhada
descontração na segunda etapa. Sensação parecida com a vivida nos 5-0 no
Grêmio. Até hoje me emociono quando mergulho no clima daquela madrugada.
BICAMPEONATO BRASILEIRO 1982 –
GRÊMIO 0-1 FLAMENGO
A poucos dias de me mudar de
apartamento, aconteceu essa Final. Eu era amigo de um vascaíno que gostava de
ver o jogo lá em casa para secar. A gente deixava, porque era legal ver a
expressão glútea dele após cada taça ganha. Antes desse jogo, cravei: “2-0
nós”, ele: “Lá no Sul? Nunca”. Depois que o Zico meteu entre as pernas do
Vilson Tadei e tocou para o Nunes resolver, aconteceu algo diferente, o garoto
se mandou, prevendo o “pior”. Não deu outra, mais uma taça na minha breve vida
de torcedor.
TRICAMPEONATO BRASILEIRO 1983 –
FLAMENGO 3-0 SANTOS
Ninguém tinha a menor ideia de
que o Zico estava indo embora, nem que jogou no sacrifício. Mas a confiança no
título era grande, o Flamengo voava no Maracanã. E a confiança virou certeza
depois do gol com menos de um minuto. Mas foi mais difícil que o placar sugere.
De qualquer forma, a cabeçada do Adílio seguida da porradaria do Santos com os
jornalistas foram marcantes.
TETRACAMPEONATO BRASILEIRO 1987 –
FLAMENGO 1-0 INTERNACIONAL
Nós iríamos viajar na noite
daquele domingo. Eu me lembro de ter ficado apreensivo com o temporal que caiu
no Rio, porém o time do Flamengo era muito, mas muito melhor. O Inter jamais
ameaçou. Depois do jogo e da festa, viajamos e pude estrear minha camisa rubro-negra
(a primeira que comprei oficial, tenho até hoje) tinindo de nova. Com a altivez
dos campeões.
COPA DO BRASIL 1990 – GOIÁS 0-0
FLAMENGO
Essa foi complicada, porque a TVE
só passou para cá o primeiro jogo. O jeito foi se virar no rádio e sofrer muito,
o locutor toda hora gritando o nome do Zé Carlos. Quando acabou, marcou o choro
do Gilbertinho: “eu não sou perdedor”. Sempre comemorei muito ganhar Copa do
Brasil, mesmo essa primeira que não foi muito badalada, era uma época muito
difícil e esse título meio que atenuou um ano um tanto melancólico.
PENTACAMPEONATO BRASILEIRO 1992 –
BOTAFOGO 2-2 FLAMENGO
Fui muito sacaneado na Faculdade
quando o Flamengo caiu num “grupo da morte” contra Vasco, São Paulo e Santos.
Mas não deixava por menos, falava cheio de marra “Flamengo é favorito e vai
passar”. Passou. Diziam que Botafogo iria atropelar. “O dia que eu tiver medo
do Botafogo nunca mais vejo futebol”. Foi uma das finais mais fáceis, mas a
tragédia entristeceu. De qualquer forma, na segunda-feira assisti devidamente
trajado a todas as aulas. E ninguém teve coragem de chegar perto.
TRICAMPEONATO ESTADUAL 2001 –
VASCO 1-3 FLAMENGO
Primeira final ao lado da minha
então namorada (hoje esposa). Ela resolveu ver o jogo, “para sentir o clima”.
Não tive medo de “pé-frio” porque não sou botafoguense. Quando o Edilson fez
1-0 de pênalti, senti uma onda irresistível de confiança e ali tive a certeza
de que ganharíamos. No gol do Pet, gritei e pulei tanto que ela achou que eu ia
morrer. Terminei aquele jogo sem voz.
BI COPA DO BRASIL 2006 – FLAMENGO
1-0 VASCO
Havia sofrido demais no jogo com
o Ipatinga, que tive que acompanhar ligando para casa (estava em viagem, sem TV
ou rádio passando). Mas as finais com o Vasco achei tranquilas, Flamengo sempre
superior, tal como no Estadual-2004. Renato Gaúcho tocou marra, falou no
esquema da Itália campeã do mundo, mas nós fomos superiores nos dois jogos
(explodi em risos com a expulsão do Valdir Papel, o Renato quase cobrindo o
cara de porrada). Comemorei bastante aquele título, resposta aos vices de anos
anteriores.
HEXACAMPEONATO BRASILEIRO 2009 –
FLAMENGO 2-1 GRÊMIO
Nessa final o problema do delay
foi complicado. Aquela expectativa toda de quebrar o jejum de 17 anos, semana
toda pilhado e nervoso, chega a hora do jogo e “gooool...” do Grêmio, ouvi vozes
gritando quando nem o escanteio havia sido cobrado. Passa um tempo e a rua
rebenta num barulho infernal com o gol de empate, e igualmente o Flamengo ainda
ia bater o córner. Segundo tempo adotei solução radical, meti um fone de ouvido
e consegui ser feliz, gritando o gol do Angelim na hora certa. Depois, foi só
festejar.
TRI COPA DO BRASIL 2013 –
FLAMENGO 2-0 ATLÉTICO/PR
Final com jogo se arrastando em
0-0 com a vantagem do empate é o negócio mais torturante que existe. Partida
nervosíssima, tensa, mas o momento era nosso. E quando o Elias abriu o placar
no finalzinho eu sabia que tava acabado. Também foi um título muito festejado,
pelo que significou.
BI COPA LIBERTADORES 2019 –
FLAMENGO 2-1 RIVER PLATE-ARG
O nível de pilha e tensão nessa
Final era tanto que passei o jogo todo em transe, sem conseguir perceber que o
tempo estava escoando e o título indo embora. Um apressado meteu um poster do
River Plate no WhatsApp antes da hora e instantes depois o Gabigol empatou.
Entrei num êxtase tipo “se empatar, vira” e na hora que a bola sobrou para o
Gabigol eu comecei a berrar antes mesmo da rede ser estufada. Mais uma taça que
me deixou sem voz. O gozo da glória eterna. Ah, e o cara do poster sofreu... E
como sofreu!
HEPTACAMPEONATO BRASILEIRO 2019 –
PALMEIRAS 1-2 GRÊMIO
Estava calmamente tomando minha
cerveja enquanto via pela TV a colossal festa da torcida flamenga nas ruas do
Rio de Janeiro, com geral já bêbado. Eis que pipoca um aviso de que o garoto
Pepê havia, nos descontos, marcado o gol da vitória do Grêmio sobre o
Palmeiras, tornando, assim, o Flamengo matematicamente campeão brasileiro. Dois
títulos em dois dias me lembrou o tri carioca em dois anos, pensei. Restou-me
abrir mais uma latinha.
OCTACAMPEONATO BRASILEIRO 2020 –
INTERNACIONAL 0-0 CORINTHIANS
As lambanças do Hugo e a apatia
do time na derrota decisiva no Morumbi haviam drenado minha energia e minha
vontade de ver o resto do desfecho. Inverti para o jogo do Beira-Rio de forma
meio automática, como que previsse o pior. Ainda faltava um bom cacho de
minutos e eu ali, inerte. Mas o tempo foi passando, passando... E o Corinthians
resistindo. E, com isso, a pilha voltando. Nos minutos finais, já estava
gritando e berrando. Edenilson faz o gol: “Acabou”, pensei. Mas num átimo
aparece a bandeira salvadora. Replay demora, mas mostra o impedimento claro.
Logo depois, a agonia termina. Ainda sem acreditar, eu era campeão brasileiro
de novo. E é claro que comemorei, mesmo lívido.
TETRA COPA DO BRASIL 2022 –
FLAMENGO 1-1 CORINTHIANS (PEN FLA 6-5 COR)
Ainda convalescendo de cirurgia de
vesícula, não pude ver o primeiro jogo. Mas a finalíssima não tinha como
perder. E, coroando o ciclo de gerações, pela primeira vez tive a companhia de
dois dos meus três filhos, os mais velhos, que estão com idade parecida à que
eu tinha quando tudo isso começou. Gritamos, roemos unha, sofremos e explodimos
com o gol de Rodinei. Depois do abraço, quase sem voz avisei: “vão se acostumando
que o Flamengo é assim, sofrido”.
TRI COPA LIBERTADORES 2022 –
FLAMENGO 1-0 ATHLETICO
Dessa vez quem viu o jogo comigo
foi o caçula, de sete anos. E aí a coisa foi ainda mais simbólica, porque eu,
meu pai (companheiro de todas as jornadas) e Joãozinho assistimos juntos, o
menino com a exata idade que eu tinha em 1979. Após o apito final, a certeza de
que gerações vão e vêm, mas o amor, a paixão, a fome de vitórias e títulos e,
acima de tudo, a devoção pelas cores negra e vermelha seguirá pairando sobre
nossa existência, nossa essência, nossa vida. E que venham mais e mais momentos
como o de sábado passado e os vividos nesses maravilhosos 43 anos de futebol.
E, mais uma vez, Graças a Deus sou Flamengo. Que coisa linda é ser Flamengo. Não
há nada igual a ser Flamengo.
Boa semana a todos.