Saudações flamengas a todos.
Uma das coisas que
gosto de escrever é sobre mitos e lendas que, por algum motivo, repousam no imaginário
geral, ou, em outra vertente, são maldosamente disseminadas com o único intuito
de produzir controvérsias vazias. Então, separei alguns casos a seguir.
“Em 1980, o
Flamengo perdeu a chance de ser Tetracampeão Estadual ao ser derrotado e
eliminado pelo Serrano de Petrópolis, com gol de Anapolina.”
FALSO. A derrota foi determinante para a perda do título, mas não eliminou o Flamengo.
Na última
rodada, o Vasco enfrenta o Americano em São Januário. O Vasco abre o placar com
um gol de Roberto no início e vai mantendo a magra vantagem que lhe dá o
título. Mas, aos 33 minutos da segunda etapa, o Americano empata num belo chute
de longe. Com o empate, o Flamengo ganha a chance de forçar um jogo-extra para
decidir o turno. Mas, no último lance da partida, o time de Campos, com dois a
menos (expulsos), não resiste. Um gol de cabeça de Roberto dá o turno ao
cruzmaltino e tira o Flamengo da briga pelo Tetra. No dia seguinte, o
rubro-negro derrota o Volta Redonda por 4-3, no Raulino de Oliveira às moscas, fechando
assim de forma melancólica sua participação em um Estadual no qual não perdeu
nenhum clássico. A derrota em Petrópolis, decisiva, acaba ficando para a
história como o jogo-chave da eliminação. Que, a rigor, somente é consumada no
último jogo.
“Cláudio
Coutinho teve um final trágico, falecendo quando era treinador do Flamengo”
FALSO. Muitos fazem essa confusão, mas, embora ainda muito ligado ao clube, Coutinho já não trabalhava no Flamengo quando a tragédia aconteceu.
“O Flamengo
foi o primeiro clube brasileiro a exibir patrocínio nas camisas”
FALSO. Essa lenda urbana pode ser confrontada com uma prova documental tão farta que causa espanto ter ganho tanto corpo ao longo do tempo.
O uso de logomarcas de patrocínio em camisas sempre fora proibido no Brasil. A despeito de alguns eventos pontuais ao longo da história (o Bangu utilizou, nos anos 1950, uma camisa com um escudo “disfarçado”, que na verdade era a marca da fábrica de tecidos que funcionava no bairro, o Fluminense usou camisa com a marca do Mobral, antigo programa educacional do governo federal, em um amistoso contra o Bayern Munique-ALE no Maracanã em 1975), somente em fevereiro de 1982 a prática é liberada pelo CND (Conselho Nacional de Desportos), e assim mesmo restrita a amistosos. O Internacional se vale dessa brecha e estampa a marca da Pepsi em um torneio no Uruguai. A partir de junho/julho do mesmo ano, a liberação é estendida para jogos oficiais. E o Democrata de Sete Lagoas/MG, logo seguido pelo Ceará, é o primeiro clube a fechar acordo de patrocínio válido para uma competição oficial.Fonte relevante de
receitas num futebol cada vez mais deficitário, o uso de publicidade
nas camisas logo se expande. Na Final do Brasileiro de 1983, o Santos enfrenta
o Flamengo exibindo nas costas a marca das Casas Bahia, e na Primeira Fase do
Brasileiro de 1984 é possível ver Corinthians, Vasco, Santos,
Internacional, Portuguesa, Bahia, Confiança/SE, Anapolina/GO, Joinville/SC e
várias outras equipes indicando que a prática “veio para ficar”.
Assim, embora
tenha aderido ao uso de patrocínio na camisa nos primeiros anos, o Flamengo
está longe de ter sido o seu precursor.
“O Regulamento
do Campeonato Brasileiro de 1995 previa o descenso de quatro clubes para a
Série B, mas houve uma virada de mesa, durante a competição, que reduziu o número
de rebaixados para dois, para impedir que o Flamengo caísse.”
Encurtando, porque não dá para gastar muita linha com esse tópico: o Brasileiro de 1995 foi disputado por 24 clubes, divididos em dois grupos. A Primeira Fase foi dividida em dois turnos. No Primeiro Turno, os times jogaram dentro dos respectivos grupos, e no Segundo Turno as equipes de um grupo enfrentaram as da outra chave. Os ganhadores dos respectivos grupos em cada turno passaram às Semifinais, disputadas em matamata. Apurada a soma total de pontos na Primeira Fase, os dois últimos colocados foram rebaixados à Série B.
O Brasileiro teve
início em 19 de agosto. Pode-se verificar seu regulamento, por exemplo, nas
páginas dos jornais da época:
Folha de São
Paulo, 18 de julho:
Jornal do Brasil, 28 de agosto (dia seguinte ao da estreia do Flamengo, com vitória sobre o Bragantino, 2-1):
Enfim, é aquilo. Alguns não “noticiam” o que aconteceu, mas o que gostariam que houvesse ocorrido. Para os que apreciam detalhes sobre viradas de mesa ou “manobras” de bastidores, 1995 é o ano errado para procurar coisas do tipo. Mas, logo ao lado, já no ano seguinte, pode-se encontrar farto material. Fluminense e Bragantino que o digam.
“O Flamengo
estava sendo rebaixado no Brasileiro de 2005, quando um gol milagroso de Obina
contra o Paraná, marcado nos descontos, salvou o rubro-negro.”
FALSO (“ma non troppo...”).
Esse é outro mito que sobreviveu ao tempo. Fato é: nem o empate contra os
paranaenses rebaixava o Flamengo, nem o gol da vitória por 1-0, marcado por
Obina aos 47 do segundo tempo, salvou matematicamente o rubro-negro. Mas, na
prática...
Depois de operar um milagre, com 4 vitórias e 2 empates em seis jogos (sequência inédita em anos), o time do Flamengo, agora sob Joel Santana sai de uma Zona de Rebaixamento que ocupou por todo o Brasileiro (chegando a estar na lanterna), sem nenhuma perspectiva aparente de salvação. A três rodadas do final, o rubro-negro ocupa a 16ª colocação, três pontos acima da Zona de Rebaixamento, e vai a Curitiba enfrentar o Paraná Clube no Estádio Pinheirão.
O gol de Obina acaba se tornando o símbolo da salvação
flamenga. Esse é o tipo de marca que, embora não seja rigorosamente precisa,
talvez seja interessante cultivar, à guisa de certo tributo ao carismático e
simpático atacante.
Boa semana a todos.