segunda-feira, 11 de outubro de 2021

O Sinuoso Caminho do (s) Tri (s)

Montanha Tianmen, China

Salve, Buteco! Nos últimos três jogos, o Flamengo conquistou sete de nove pontos, disputados contra uma formação alternativa do Athletico/PR, finalista da Copa Sul-Americana, sétimo colocado no Campeonato Brasileiro e nosso adversário na semifinal da Copa do Brasil; contra o também finalista da Copa Sul-Americana e atual quinto colocado do Campeonato Brasileiro, o Bragantino, e contra o atual quarto colocado do Campeonato Brasileiro, o Fortaleza da revelação argentina Juan Pablo Vojvoda. Esses números são citados pela "FlaDesfrute", composta por autodenominados descolados e experientes torcedores, os arautos do pragmatismo e da razão, como provas cabais do que seria um discurso fraco da "FlaMimimi", grupo de emocionados, de tendências "nutellísticas", que atribui ao treinador a responsabilidade por um esquema que seria cada vez mais bagunçado.

A vida é um desencadeamento contínuo de fatos e, quando os analisamos, inevitavelmente fazemos recortes temporais para contextualizá-los. A depender de como recortamos, criamos uma narrativa fantasiosa ou nos aproximamos do ideal da "realidade dos fatos". 

Desde a derrota em casa para o Grêmio, pela 21ª Rodada do Campeonato Brasileiro, o debate sobre a, digamos, "tendência" do nosso treinador Renato Gaúcho de priorizar as copas em detrimento da maior competição nacional ganhou corpo. Eu mesmo, furioso, cornetei com força a postura do time e, principalmente, do treinador

Não retiro as criticas, mas hoje, por lealdade à minha consciência, vejo-me forçado a lembrar que o jogo, disputado na noite de domingo, 19 de setembro, antecedeu em três dias o primeiro confronto contra o Barcelona de Guayaquil, pelas semifinais da Libertadores, e sucedeu em três dias o anúncio, pela CBF, da remarcação dos jogos adiados da 4ª e 19ª Rodadas, a serem disputados com outros dois no espaço de 8 (oito) dias, ou seja, um jogo a cada 2 (dois) dias.

Por outro lado, em que pese o contexto, é fato que o medonho desempenho contra o tricolor gaúcho, que repetiu em nível de má-qualidade a exibição contra o colorado gaúcho, também no Maracanã, foi sucedido por dois frustrantes empates (Bragantino e América/MG) de formações muito desfalcadas, intermediados por uma convincente vitória da formação principal sobre uma fromação alternativa do Athletico/PR. Para piorar, alguns titulares não convocados nas "Datas FIFA" não entraram em campo, e em razão disso o Mais Querido jogou com ainda mais desfalques do que o esperado. Como jornalistas afirmaram que alguns desses jogadores titulares, não convocados, chegaram a ser poupados, a polêmica ganhou ainda mais corpo, a ponto do treinador se pronunciar de maneira contundente na coletiva de sábado à noite, após a vitória por 3x0 sobre o Fortaleza, negando que tenha poupado qualquer jogador.

Flamengo sem polêmica talvez seja uma entidade meramente mitológica, porém percebam que, nesse específico caso, ela, a polêmica, é inevitável. É que, se o treinador não poupou (e Amigos, ele afirmou categoricamente que não poupou), temos um problema sensível no Departamento Médico, que, como todos sabemos, é vinculado ao Departamento de Futebol. São muitas contusões... Agora pensem comigo: se já não deve ser simples para profissionais especializados identificar as causas para as contusões dentro das áreas de preparação física, fisiologia e medicina, que interagem entre si e com a atividade do futebol profissional, imagine para nós, torcedores, que podemos apenas nos fiar em informações ora fornecidas pelo clube, ora pelos jornalistas, ora pelos "YouTubers". Nesse ponto, remeto vocês ao texto de duas semanas atrás, no qual inclusive me reporto a duas matérias (1 e 2) nas quais o tema é abordado. 

Obviamente, se alguma reformulação vier a ser feita no setor (e parece que algo precisa mesmo ser feito), não ocorrerá ainda nesta temporada, pois seria como trocar os quatro pneus de um carro em movimento. Diante disso, vou repetir o que escrevi naquele texto: como o treinador tem uma propensão natural a poupar, o contexto de convocações, contusões em série e jogos nos meios e finais de semana acaba sendo uma espécie de "gatilho" para ele repetir a fórmula que adotou (sem sucesso em Brasileiros, mas com relativo sucesso em Copas) no seu clube anterior. Ao mesmo tempo, em algumas situações esse difícil cenário pode até justificar não só o receio do treinador, como algumas de suas decisões.

Como, então, identificar quando estamos diante de uma ou outra situação?

O risco que se corre a cada vez que o tema é debatido é embarcar em narrativas que podem até ter sua existência justificada por indicios, mas certamente não são respaldadas por fatos conclusivos. E como estão em jogo "dois tricampeonatos", um "consecutivo" e outro "não consecutivo", as análises são carregadas por naturais cobranças, regadas por altas doses de emoção e ansiedade. Então, para enriquecer o debate, trago a vocês alguns dados concretos, seguidos de breves reflexões.

Vamos começar pelas tabelas do Mais Querido e do rival favorito ao título brasileiro:

Rodada

FLAMENGO

Atlético/MG

2ª Rodada – Adiado (data indefinida)

Grêmio (f)

---

26ª Rodada - MDS

Juventude (c)

Santos (c)

27ª Rodada - FDS

Cuiabá (c)

Atlético/GO (f)

Copa do Brasil – Semifinal (Ida)

28ª Rodada - FDS

Fluminense (f)

Cuiabá (c)

Copa do Brasil – Semifinal (Volta)

29ª Rodada - FDS

Atlético/MG (c)

Flamengo (f)

4ª Rodada – Adiado

Athletico/PR (f – 3ª F, 2/11)

---

19ª Rodada – Adiado

Atlético/GO (c – 6ª F, 5/11)

Grêmio (c – 4ª F, 3/11)

30ª Rodada – FDS

Chapecoense (f)

América/MG (c)

31ª Rodada – MDS

Data Fifa

Bahia (c)

Corinthians (c)

32ª Rodada – FDS

Data Fifa

São Paulo (f)

Bahia (f)

33ª Rodada – MDS (Data Fifa na véspera)

Corinthians (c)

Athletico/PR (f)

34ª Rodada – FDS

Internacional (f)

Juventude (c)

35ª Rodada – MDS

Sport Recife (f)

Palmeiras (f)

36ª Rodada – FDS

Copa Libertadores da América (Final)

Fluminense (c)

Ceará (c)

37ª Rodada – MDS

Santos (c)

Bragantino (c)

38ª Rodada – FDS

Atlético/GO (f)

Grêmio (f)

8 de dezembro

Copa do Brasil – Final (Ida)

12 de dezembro

Copa do Brasil – Final (Volta)

Primeira constatação: hoje, o Flamengo tem quatro jogos adiados e o Atlético/MG apenas um. "Como assim quatro jogos atrasados, Gustavo?" Amigos, vocês já perceberam que o confronto contra o Ceará, no Maracanã, está marcado para o mesmo final de semana da final da Libertadores? Então é muito simples: desde o apito final do árbitro chileno Roberto Tobar, nos 2x0 sobre o Barcelona no Monumental Isidro Romero Carbo, em Guayaquil, o Flamengo tem quatro jogos adiados. O fato da CBF ainda não haver anunciado formalmente o adiamento do jogo contra o Ceará é um mero detalhe.

É bem verdade que, até a final da Libertadores, serão apenas dois jogos atrasados, eis que a CBF remarcou os jogos contra Athletico/PR (4ª Rodada) e Atlético/GO (19ª Rodada), respectivamente, para os dias 2 e 5 de novembro (terça e sexta-feira). Observem que o jogo atrasado do Atlético/MG, contra o Grêmio, pela 19ª Rodada, foi remarcado para o dia 3 de novembro (quarta-feira). Portanto, o Flamengo, hoje, trabalha com um cenário de quatro jogos atrasados e encaixados no apertado calendário, tendo apenas a metade deles, ou seja, dois, sido remarcados. Também é certo que, após o jogo remarcado contra o Atlético/GO, o Flamengo terá dois jogos a menos que o Atlético/MG, que já não terá mais jogos atrasados.

Dentro desse cenário, existe mais uma variável, na verdade, uma senhora variável: o jogo do Campeonato Brasileiro contra o Sport Recife, em Recife, pela 35ª Rodada, em tese deverá ser disputado no meio da semana que antecede a final da Libertadores, marcada para o dia 27 de novembro, em Montevidéu. Ocorre que a Conmebol costuma exigir que os finalistas cheguem com antecedência à sede da final, o que, também em tese, deveria inviabilizar a disputa da partida na quarta-feira. Desconhecendo se a mesma exigência será feita para a final do dia 27/11, parece evidente que, em termos de logística, o mais sensato seria a CBF adiar o jogo contra o Sport e permitir ao seu afiliado viajar diretamente de Porto Alegre (Internacional, 30ª Rodada, no final de semana) a Montevidéu, concordam? Mas será que há boa vontade política para uma solução racional?

Se houver, passaremos a trabalhar com um cenário de encaixe de cinco jogos na tabela, três deles para datas posteriores à final da Libertadores. Se não houver, vejo duas alternativas: na primeira, a CBF complicaria ainda mais a nossa vida e anteciparia o jogo contra o Sport, aumentando a maratona antes da Libertadores. Na segunda, o jogo simplesmente não seria adiado e a "solução" para o Mais Querido seria utilizar uma formação mesclada entre terceiros reservas e sub-20 para o jogo de Recife, o que fatalmente comprometeria as aspirações de conquista de três pontos. É claro que o clube poderia recorrer ao STJD, mas o desfecho, como em qualquer processo contencioso no meio jurídico, seria incerto.

A postura do Palmeiras, na minha opinião, é uma incógnita. Para início de conversa, pela 34ª Rodada, o clube enfrentará o Fortaleza, no Castelão, enquanto, pela 35ª Rodada, terá como adversário, em São Paulo, ninguém menos que o... Atlético/MG! Vejam só como o cenário é complexo... Internamente, o clube paulistano certamente deve estar pesando fatores como as chances de título brasileiro (cada vez mais remotas) e a segurança de vaga na Fase de Grupos da Libertadores/2022, haja vista a distância para Bragantino, Fortaleza, Corinthians e Internacional, bem como os classificados para a final da Copa do Brasil e a possibilidade do Bragantino ser campeão da Sul-Americana, classificando-se diretamente para a Libertadores.

Outro fator relevante é a viabilidade de enviar equipes alternativas, até com atletas sub-20, sem sacrificar reservas importantes para compor o banco na final da Libertadores, pois o parágrafo único do artigo 41 do Regulamento-Geral de Competições da CBF limita a 5 (cinco) os atletas não profissionais relacionados para cada partida. É claro que essa variável também deve estar sendo avaliada pelo Departamento de Futebol do Flamengo, mas ao mesmo tempo mostra que atrapalhar o Flamengo pode ter custo alto para o Palmeiras.

Não é difícil imaginar qual será a posição dos mineiros quanto ao tema, assim como é fácil constatar que, mesmo em caso de eventual adiamento desses dois jogos (Sport x Flamengo e Palmeiras x Atlético), a sua remarcação dificilmente escapará de alguma polêmica, dados os outros dois jogos adiados do Flamengo e os interesses conflitantes desses três protagonistas, sem mencionar o fato do Sport Recife estar lutando contra o rebaixamento. Porém, não custa recordar do precedente mais recente, também ocorrido em um contexto pandêmico, tal qual o atual.

Há pouco menos de dez meses, ou seja, em janeiro/2021, Palmeiras e Santos, finalistas da Libertadores/2020, tiveram adiados os seus jogos pela 33ª Rodada do Brasileiro/2020, haja vista a coincidência de datas com a final da competição sul-americana, disputada no sábado, dia 30 de janeiro de 2021. O Palmeiras jogou logo na terça-feira seguinte, 2 de fevereiro, empatando em casa por 1x1 com o Botafogo. Já o Santos só foi disputar o confronto adiado 15 (quinze) dias depois, quarta-feira, 17 de fevereiro, quando bateu o Corinthians na Vila Belmiro por 1x0.

Ambos os finalistas da Libertadores/2020 não tiveram que jogar no meio de semana que antecedeu a final. A eles, de maneira absolutamente justa, foi concedida comodidade de um intervalo de 6 (seis) dias entre seus jogos pela 32ª Rodada do Brasileiro/2020, disputados no domingo, 24 de janeiro, e a final, disputada no sábado seguinte, dia 30. Desse modo, o Palmeiras, após jogar contra o Ceará no Castelão (Ceará 2x1), e o Santos, após enfrentar o Goiás na Vila Belmiro (3x4 Goiás), jogos nos quais seus jogadores claramente "tiram o pé", puderam então pensar exclusivamente na final do sábado seguinte, disputada, como todos nos lembramos, no Maracanã, Rio de Janeiro, local bem mais próximo do que Montevidéu. 

Estranhamente ou, como vocês verão logo à frente, talvez nem tanto, encontrei apenas duas matérias abordando o tema. A primeira, de 13 dias atrás, é do Super Esportes, de Minas Gerais, a qual aborda a final da Libertadores entre Flamengo e Palmeiras. A imprensa mineira parece ter expectativas positivas, sob o ponto de vista local, ou seja, atleticano, quanto ao desfecho da 35ª Rodada, o que pode ser extraído do seguinte trecho: "A reta final da temporada reserva muitas emoções ao torcedor dos dois clubes. Em 24 de novembro, por exemplo, o Palmeiras enfrentará o Atlético pelo Campeonato Brasileiro em duelo da 35ª Rodada - três dias antes da final da Libertadores. Atualmente, os dois times estão na briga pela taça - o Galo tem oito pontos a mais que o time alviverde."

A segunda, do jornal O Dia, publicada há uma semana, aponta o conflito de datas entre a final da Libertadores e a 36ª Rodada, na qual o Flamengo enfrentará o Ceará e o Palmeiras o Cuiabá. Cometendo o equívoco de tratar os confrontos como pertencendo à 35ª e não à 36ª Rodada, a matéria é silente quanto aos confrontos do meio de semana, pela 35ª Rodada, a serem supostamente disputados no dia 24 de novembro. São muitos detalhes a serem considerados simultaneamente, mas os Amigos do Buteco não devem perder de vista que adiar o jogo do Sport Recife aumenta muito as chances de remarcação para datas próximas à final da Copa do Brasil, acaso o Flamengo se classifique. Logo, o obsequioso silêncio talvez não seja mesmo tão estranho assim...

Desse modo, no momento, podemos concluir que a hipótese mais provável é a de não ocorrer o adiamento dos jogos de Flamengo e Palmeiras pela 35ª Rodada do Campeonato Brasileiro, obrigando o clube a se deslocar entre Porto Alegre, Recife e Montevidéu na semana da final da Libertadores. Nesse caso, ninguém deve ter maiores esperanças quanto à conquista de três pontos no jogo de Recife, até porque os anfitriões estão em franca ascensão na tabela, sob o comando do paraguaio Gustavo Florentín.

Pensam que acabou? Respirem fundo que ainda sobrou uma variável...

É que ainda persiste a indefinição quanto ao término do Campeonato Brasileiro, inicialmente programado para o domingo, 5 de dezembro. Quando ainda se encontrava de pé a promessa da CBF de adiar os jogos de clubes que tivessem jogadores convocados para as Datas FIFA, esta matéria do site Globo Esporte dava conta da decisão de "avançar a Série A no mês de dezembro". Contudo, com o recuo da entidade na decisão de adiar esses jogos, ninguém sabe se haverá mesmo avanço ou, se houver, qual será a sua extensão.

Como o cartaz do Flamengo não anda alto pelos lados da CBF, ninguém deve nutrir expectativas muito altas quanto a este ponto. É certo, porém, que, num cenário de 2 a 3 jogos adiados e remanescentes após a final da Libertadores, em tese quanto mais o Campeonato Brasileiro avançar dezembro adentro, melhor para o Flamengo, isso, é claro, se até lá permanecerem as chances de título. Do contrário, talvez seja melhor acabar logo e ter mais tempo para se preparar para a final da Copa do Brasil, isso, é claro, se o Flamengo se classificar. Nesse cenário, quem tem planos de atrapalhar o Flamengo pode subitamente mudar de ideia e passar a entender que estender o campeonato é a melhor solução.

Entenderam? Não? Relaxem. Talvez seja impossível entender a insanidade dos dirigentes e do calendário do futebol brasileiro, cuja única certeza que nos propiciam é a incerteza.

Enfim, Pessoal, pesando tudo na balança, cheguei à conclusão de que qualquer avaliação sobre o trabalho do Renato, como, por exemplo, aquelas envolvendo as decisões quanto a quem relacionar e escalar, precisam ser contextualizadas. Renato dificilmente está tomando essas decisões sozinho... Pelo mesmo motivo, também é preciso ter cuidado com conclusões definitivas, como, por exemplo, aquelas relacionadas ao padrão tático da equipe.

Tenho uma convicção nesse sinuoso caminho em direção aos tricampeonatos: Renato não é perfeito, mas sobram experiência e maturidade ao nosso treinador, qualidades valiosas para um cenário tão confuso e desafiador.

2022 é outro papo...

Carpe diem.

Bom dia e SRN a tod@s.