segunda-feira, 19 de julho de 2021

May The Force Be With You, Mengo!

Renato "Jedi" ou "Sith"?
Renato "Jedi" ou "Sith" Gaúcho?

Salve, Buteco! Desde que Jorge Jesus chegou ao Flamengo, o time vem jogando um futebol agressivo, com grande influência tática europeia, ou seja, do que vem sendo aplicado no primeiro mundo do futebol. Jorge Jesus foi uma espécie de cometa que extinguiu os dinossauros, que ameaçaram ressurgir no período pós-pandemia, como os exemplos de José Mourinho e Abel Braga comprovam, mas nada como o tempo para deixar as coisas em seu devido lugar. Hoje em dia é muito difícil ver um time que não adote ao menos em parte dos 90 minutos uma saída de três ou a marcação alta agressiva. É possível chegar a essa constatação assistindo a qualquer partida da Série B brasileira, por exemplo.

No caso do Flamengo, porém, eu vejo uma peculiaridade. Depois que Jesus se foi, o Flamengo passou a ser treinado por adeptos do sistema de jogo posicional, cada qual com a suas preferências na maneira de execução. Como já conversamos várias vezes por aqui, os adeptos do sistema, e da filosofia que o embala, vão além da modernidade tática e gostam muito de inovações como mudanças de posição dos atletas, além de serem avessos a posturas mais pragmáticas durante as partidas. Domènec Torrent aplicou à vera esses princípios. Odiado pelas maiores estrelas do elenco, mal durou três meses no cargo.

Rogério Ceni começou tentando ressuscitar Jesus, mas aos poucos foi aplicando os seus conceitos. Além de não conseguir atingir o seu intento inicial, e ressalvados os três importantes títulos, acabou perdido entre o seu ego, a incapacidade de reconhecer erros e a dificuldade de gerir o vestiário e abrir mão de alternativas que havia descoberto. Úteis alternativas, mas sem sustentabilidade para serem o plano A do time. Ceni foi mais exitoso e durou bem mais do que Domènec, porém conseguiu a proeza de ser odiado por todo o Departamento de Futebol, algo que nem o catalão conseguiu.

Um ano de jogo posicional ensinou ao clube que, além da tática, é preciso ter gestão de elenco e de vestiário. O futebol brasileiro tem uma cultura, goste-se ou não dela. As inovações táticas devem ser acompanhadas de um tratamento que a maioria dos jogadores brasileiros não dispensa.

Por exemplo, jogador brasileiro não não é simpático a bruscas e frenéticas mudanças de posição (percebam a diferença para mudança de função tática). Não é impossível que aceite, só que, antes, o elenco precisa comprar a ideia.

Não se diz impunente a um consagrado zagueiro com crônicos problemas físicos que ele jogará na lateral direita, ou ao volante titular que passará a ser zagueiro. Talvez na Europa não reclamassem, mas no Brasil é diferente.

A ferramenta é ótima, inclusive pela maneira como aproveita a base (não foi bem o caso do Ceni, mas foi o de Domè), porém não se muda uma cultura mais do que secular de uma hora para outra. É preciso haver adaptação.

Essa parece ser a grande lição das passagens de Domènec Torrent e Rogério Ceni pelo Flamengo.

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Renato Gaúcho, assim como Jorge Jesus, sabe ler bem o jogador brasileiro e, mais do que isso, o Flamengo e a sua torcida. Com Jesus, zagueiro foi zagueiro, volante foi volante, meia foi meia e centroavante foi centroavante. Respeitar os limites dos jogadores não foi empecilho algum para o Mister aplicar o sistema tático mais eficiente e sofisticado de toda a história de um clube que já teve nomes como Cláudio Coutinho e Telê Santana como treinadores. 

Nesse ponto, Renato repete Jesus. Os jogadores parecem felizes dentro de campo. Arão voltou à posição que o consagrou em 2019, Diego voltou à posição na qual o Mister o aproveitava e até o Léo Pereira voltou a dar sinais de vida. Aliás, Arão voltou a fazer a saída de três "lavolpiana", tal como fazia com o Mister em 2019. Como explicou o sempre lúcido Bruno Pet (@obrunopet) neste tuite, "Arão e Diego melhoraram a saída de bola, que se manteve como Renato gosta: saída sustentada com volantes e laterais se aproximando dos zagueiros e que as vezes varia para uma saída de 3 com Arão descendo na linha dos zagueiros."

Pronto. Não era tão difícil, concordam?

"A vaidade é, definitivamente, o meu pecado favorito", dizia o sombrio personagem de Al Pacino na cena final daquela histórica película.

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Acalmem-se aqueles que pensam que estou comparando Renato Gaúcho a Jorge Jesus. Não é absolutamente o caso. Aliás, fico com o alerta que dei no post da semana passada: o sarrafo, no Flamengo, é bem mais alto e nada, simplesmente nada do que Renato fez até agora na carreira pode ser comparado ao nível do trabalho de Jorge Jesus, inclusive no aspecto tático.

Feita essa ressalva, bem como a de que Renato praticamente não treinou o Flamengo antes da partida na Argentina, é preciso destacar que o Defensa y Justicia é um adversário amplamente superior, no plano tático, ao Bahia de Dado Cavacanti. O nível de exigência será bem mais alto, como comprovam as seguintes imagens do jogo em Florencio Varela, extraídas do videotape disponível no YouTube:


Repararam como os jogadores do DyJ frequentemente "encaixotaram" os nossos jogadores que poderiam receber o passe de quem estava com a bola? A cena me lembrou bastante algumas emblemáticas fotos do confronto entre Holanda x Argentina pela Copa do Mundo de 1974, muito famosas na internet:


Sebastián Beccacece, não se esqueçam, é adepto do sistema de jogo posicional, cuja filosofia, inspirada na Laranja Mecânica e nascida a partir das passagens de Johann Cruyff por Barcelona, como atleta e treinador, aplica de maneira fundamentalista o princípio da superioridade numérica em todos os setores do campo, inclusive na marcação.

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O DyJ não é imbatível. Longe disso. Aliás, convém ao Renato e ao Alexandre assistirem ao videotape de Palmeiras 1x2 Defensa y Justicia em Brasília, no Mané Garricha, pela finalíssima da Recopa Sul-Americana/2021. O Palmeiras teve várias chances para "matar" partida e conquistar o título. Abel Ferreira soube encontrar os espaços nos contragolpes, mas o ataque palestrino desperdiçou seguidas chances claras de gol.

Renato precisa fazer o Flamengo evoluir em relação a quarta-feira passada. E por evolução eu me refiro a "saber sair do caixote", além de, obviamente, o ataque ser tão ou mais mortal do que ontem no Pituaçu, em Salvador.

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May The Force Be With You, Mengo!!

Bom dia e SRN a tod@s.