segunda-feira, 5 de julho de 2021

Jogo Posicional de Conveniência

Salve, Buteco! Infelizmente, o Flamengo foi derrotado no Fla-Flu de ontem, numa partida que mostrou o melhor e o pior do Ceni. Vocês, que me dão a honra de ler o que escrevo toda segunda-feira por aqui, já conhecem a minha opinião sobre o treinador. Considero-o talentoso e com a capacidade que nenhum outro brasileiro mostrou, até agora, de diminuir ao menos um pouquinho a distância para os estrangeiros. Na minha opinião, os primeiros quarenta e cinco minutos do Fla-Flu provam isso. Ceni, com o elenco bastante desafalcado, conseguiu fazer o Flamengo produzir de quatro a cinco situações concretas de gol jogando com Vitinho e Michael como meias construtores, o que nem todo treinador conseguiria em seu lugar.

Aliás, a atuação do Chucky merece elogios. Logo no início da partida, o passe, na função de meia, que deu para Bruno Henrique era pra ter entrado nas estatísticas do jogo como uma assistência. Ainda no primeiro tempo, houve também aquela boa conclusão, bem defendida por Marcos Felipe, que fechou o ângulo, e no segundo tempo Chucky chegou a evitar um gol fazendo a cobertura como um volante. Impossível criticar um jogador que atuou tão fora de suas características e com tanta entrega, num bom desempenho de várias funções táticas totalmente distintas daquelas que o levaram a ser contratado.

Não tenho dúvida de que a escalação foi concebida para a dupla de ataque estar em situação confortável para decidir, dado o indiscutível padrão de qualidade de cada um. Ceni não tem culpa pelas atuações patéticas de Pedro e, especialmente, de Bruno Henrique. O narrador Luiz Roberto, da Rede Globo, ficou absolutamente à vontade para destacar, várias vezes, e coberto de razão, como Bruno Henrique errou absolutamente tudo o que tentou durante os 90 minutos. Não vi em nenhum dos nossos badalados atacantes sequer sombra da entrega de Chucky.

Ceni tem culpa, aí sim, por não substituir ao menos um dos dois (Pedro e Bruno Henrique) na etapa final, mas nesse ponto passamos a entrar em outro tópico. 

Melhor separar as coisas.

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Os quarenta e cinco minutos finais mostram o pior do Ceni. Há um padrão, acredito que reconhecido por todos, o qual vem se repetindo na maior parte das partidas, que é a queda de ritmo mais ou menos a partir dos vinte minutos da etapa final. Tal como ocorreu contra o Bragantino, Ceni partiu para o tudo ou nada, para matar ou morrer, só que vem morrendo mais do que matando, se é que vocês me entendem... O xis da questão é entender por que insiste além do aceitável com uma postura de jogo que não pode mais ser executada com eficiência a partir do momento em que os jogadores perdem o fôlego. 

Não são poucos os torcedores que atribuem a Ceni um grave defeito na leitura de jogo, qualidade indispensável para um treinador, especialmente no seletivo e competitivo nicho dos clubes de ponta do Brasil e do continente sul-americano. O que me intriga é que vejo outros fatores confluindo como causas desse problema e não sei identificar qual é o mais importante.

Por exemplo, não é comum testemunhar Ceni reconhecendo seus erros e limitações, o que lhe dá uma aura de arrogante e prepotente e o trava para encontrar soluções. Falta também a Ceni admitir, especialmente com o elenco desfalcado (contusões e convocações) e em meio a três competições simultâneas, que o time não conseguirá em todas as partidas ter a pujança que demonstrou no segundo tempo do jogo contra o Palmeiras. 

Tenho a impressão de que o seu ego precisa do reconhecimento de que é corajoso e "jamais abandona a filosofia", tal como fazem expoentes do sistema de jogo posicional, como Guardiola, Bielsa e Sampaoli. Tipo ser conhecido como o primeiro brasileiro da turma.

Aliás, esse é outro tema que merece um capítulo a parte.

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Como uma das diferentes leituras da Laranja Mecânica de 1974 e da doutrina de Johann Cruyff, e como toda variante do "futebol total", o jogo de posição necessita do que nos dias de hoje se convencionou chamar de "intensidade", algo impensável sem muita rodagem de um elenco que disputa várias competições simultâneas. E é justamente a habilidade para rodar o elenco e encontrar soluções para as diversas situações de jogo que diferencia os melhores e os piores treinadores, inclusive entre os adeptos do jogo posicional, sistema que, é bom esclarecer, não é sinônimo de time desequilibrado e nem de defesas vazadas como peneiras.

E mais: treinador de jogo posicional investe em formação e desenvolvimento dos atletas, inclusive os mais jovens, justamente por priorizar a fiel execução dessa ideia de jogo, o que exige um tempo de aprendizado. Não é que a filosofia seja incompatível com jogadores mais experientes, muito pelo contrário, mas certamente não tem como funcionar em elencos com medalhões insubstituíveis e que jamais podem começar um jogo no banco de reservas.

Tenho a nítida impressão de que Ceni aplica, de maneira convenientemente seletiva, apenas a parte da filosofia que lhe interessa, deixando de lado pontos muito importantes, que lhe dariam dores de cabeça. Ora, Ceni tem resistências para rodar o elenco, inclusive porque parece temer repetir a situação do vestiário do Cruzeiro; não parece disposto a gastar seu tempo desenvolvendo jogadores, especialmente os mais jovens, e, como se isso já não bastasse, tampouco demonstra a menor propensão para abandonar a ideia de atacar sempre, "no matter what", ou seja, de ir sempre além do limite para tentar as vitórias. 

É o que chamo de jogo posicional de conveniência, no qual o treinador só se interessa pelo bônus (e louros), mas não quer saber dos ônus ou de botar a mão na massa.

Esse complexo contexto explica a campanha do Flamengo no Campeonato Brasileiro até o momento.

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Por que João Gomes saiu mais uma vez? Por que Bruno Henrique não foi substituído? Por que Filipe Luís não foi substituído? Por que dois centroavantes e o Bruno Henrique quando o time, nitidamente, não conseguia mais levar perigo à área do adversário que, na partida de ontem, tinha mais opções no banco de reservas e passou claramente a dominar o jogo? Por que Rogério Ceni não reagiu a esse natural e previsível movimento do, com todo o respeito, limitado Roger Machado?

Até onde vai a deficiência na leitura de jogo e entram a prepotência e o jogo político com os medalhões do elenco?

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Rogério Ceni está balançando e corre grande risco de cair. Espero que, se isso vier a acontecer, a Diretoria não traga mais do mesmo e nem perca a oportunidade para resolver alguns velhos problemas. 

O Flamengo, historicamente, deixa seus jogadores mais importantes terem mais poder do que deveriam. A Diretoria, ademais, parece ter menosprezado o calendário e as convocações.

Ceni tem muita culpa no cartório, mas está longe de ser o único culpado.

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A palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.