segunda-feira, 8 de junho de 2020

O Fla-Flu e o Clássico da Rivalidade por Década

Salve, Buteco! No post da semana passada, mergulhei a fundo no retrospecto do "Clássico dos Milhões" por década, comparando também os  clubes em números de títulos oficiais e o confronto em si ao longo dos períodos de melhor fase dos dois clubes. Assim o fiz porque considero o Vasco da Gama o maior entre os três grandes rivais do Flamengo no Rio de Janeiro. Para se ter um bom parâmetro, basta nos lembrarmos deste post, o qual mostra que o Gigante da Colina, ao lado do Grêmio, é o clube que mais vezes figura na lista dos dez jogos mais importantes da História do Mais Querido. Quando se amplia a lista de jogos nos quais todo mundo votou, a liderança passa a ser isolada e disparada. Comparando os títulos conquistados pelo Vasco da Gama com os dos dois outros rivais do Rio, especialmente em âmbito internacional, a diferença se faz ainda mais visível, tornando-se definitiva quando se compara os clubes em tamanho de torcidas.

Hoje resolvi abordar da mesma maneira, ou seja, situando os respectivos retrospectos por década, o mítico "Fla-Flu" e o "Clássico da Rivalidade", tradicionais clássicos que o Mais Querido disputa contra a dupla do "Clássico Vovô", ou seja, Fluminense e Botafogo. Em nível estatístico, será uma abordagem menos aprofundada do que a da semana passada, limitando-se à quantidade de vitórias e derrotas do Mais Querido contra esses dois tradicionais adversários.

***

Década
FLAMENGO
Fluminense
Retrospecto
1910
9v
7v
9x7
1920
7v
6v
16x13
1930
15v
18v
31x31
1940
16v
14v
47x45
1950
15v
17v
62x62
1960
19v
7v
81x69
1970
16v
18v
97x87
1980
12v
8v
109x95
1990
13v
15v
122x110
2000
15v
12v
137x122
2010
19v
9v
155x131
2020
1v
1v
156x133

Não me surpreenderei se alguns rubro-negros que lerem o primeiro parágrafo deste post questionarem a condição do Vasco da Gama como maior rival carioca, haja vista a inquestionável mística do Fla-Flu. Contudo, se todo clássico entre grandes clubes necessariamente possui alguma dose de saudosismo, na minha opinião o Fla-Flu, ao longo das últimas duas décadas, foi tomado por um viés saudosista em proporção maior do que a devida para um clássico desses tamanho e fama. Os jogos mais marcantes e/ou decisivos entre os clubes são cada vez mais antigos e raros. Confrontos épicos, como o 3x3 da Copa Sul-Americana de 2017, vêm se tornando cada vez mais espaçados. Em 26 (vinte e seis) jogos que mereceram votos dos amigos do Buteco entre os mais importantes da História do clube, nenhum Fla-Flu foi lembrado. Será que o Fla-Flu ainda é tão grande como outrora?

Um olhar sobre os Fla-Flu's finais de campeonato comprova a minha assertiva: o clássico, em competições oficiais, até hoje só decidiu títulos estaduais. A vantagem tricolor de 4 (quatro) jogos (4x8) foi construída em dois períodos bem definidos: antes da década de 60 e no biênio pós-partida do Zico para a Udinese. E mesmo em campeonatos estaduais, desde a década de 90 o clássico só decidiu 3 (três) títulos, com duas conquistas do Flamengo (1991 e 2017), em que pesse a importância histórica do título tricolor no nosso centenário (1995). O certo é que Fla-Flu's decisivos são e vêm se tornando cada vez mais uma raridade, o que, a meu ver, pode ser explicado pelo franco processo de decadência do adversário, vivido a partir da segunda metade da década de 80 e bastante acelerado na década de 90 pelos humilhantes rebaixamentos para as Séries B e C do futebol brasileiro.

A verdade é que o Fluminense jamais se recuperou do final do seu ciclo histórico mais importante, que durou de 1969 a 1985, ou seja, 16 (dezesseis) anos. Nesse período, o clube conquistou nada menos do que 9 títulos estaduais e 2 campeonatos brasileiros. Na década de 70, por sinal, o Tricolor conseguiu a impressionante façanha de vencer mais Fla-Flu's do que o Flamengo. Para que os mais jovens tenham uma ideia do peso esportivo do clube na época, até os anos 90 o Fluminense ainda superava o Vasco da Gama nos confrontos diretos do, até então, historicamente competitivo "Clássico dos Gigantes". A partir da década de 90, porém, o retrospecto se reverteu a ponto de se tornar uma relação de constrangedora freguesia, marcada atualmente pela distância, que só aumenta, de impressionantes 28 (vinte e oito) jogos em favor dos cruzmaltinos, mesmo com o Vasco da Gama também estando em processo de franca decadência, o qual, como pudemos constatar no post da semana passada, foi iniciado neste século. Em razão disso, o único rival que o Fluminense ainda vence no confronto direto, mantendo a tradicional e confortável vantagem de mais de dez vitórias, é o Botafogo.

Esses dados ilustram o acelerado processo de encolhimento tricolor, não impedido e nem revertido pelo efêmero período de glórias situado entre 2007 e 2012, quando conquistou 2 campeonatos brasileiros (pontos corridos), 1 Copa do Brasil e 1 Estadual, e chegou a uma final de Libertadores e uma da Copa Sul-Americana. Esses seis anos, marcados pela injeção de dinheiro em atletas por um patrocinador e pela falta de investimento na melhoria do clube fora de campo, parecem ter sido o canto do cisne tricolor, mostrando-se cada vez menos capazes de recrutar torcedores para o clube. Chama atenção o empate técnico entre Fluminense e Botafogo no ranking de tamanho de torcidas, mesmo com a nítida superioridade tricolor em número de títulos, prova de que o Glorioso tem sido capaz de despertar mais paixão do que o aristocrático Tricolor das Laranjeiras, hoje praticamente um "sem-teto", vivendo as custas do Flamengo na administração de um Maracanã que sua torcida não consegue mais lotar, se é que algum dia conseguiu.

Contudo, se é certo que encolheu de tamanho, o Fluminense sempre merecerá o posto de um dos maiores rivais do Flamengo, até porque é o adversário que o Mais Querido enfrentou por maior número de vezes em toda sua História, num impressionante total de 427 (quatrocentos e vinte e sete) jogos. Também não tenho dúvidas em afirmar que é o clássico mais sobrenatural do mundo, onde o imponderável atua livre, leve e solto, motivado pela ofensividade inerente ao clássico, traduzindo em campo, com uma habitual chuva de gols, o lindo show de cores das arquibancadas.

***

Década
FLAMENGO
Botafogo
Retrospecto
1910
5v
4v
5x4
1920
12v
6v
17x10
1930
7v
10v
24x20
1940
14v
17v
38x37
1950
17v
11v
55x48
1960
9v
22v
64x70
1970
16v
10v
80x80
1980
14v
6v
94x86
1990
15v
11v
109x97
2000
15v
10v
124x107
2010
15v
9v
139x116
2020
1v
0v
140x116

O "Clássico da Rivalidade" é marcado pela superioridade rubro-negra. O Mais Querido, à exceção das décadas de 30, esta marcada por 4 títulos estaduais alvinegros, 40 e 60, sempre venceu mais vezes e, até os anos 60, sempre liderou o retrospecto. Contudo, a década de 60, que até hoje corresponde aos anos de ouro do rival, foi a única na qual o Glorioso liderou o confronto. Foi nessa época que se criou o mito do Botafogo como a grande "asa negra" do Flamengo. A goleada (0x6) no aniversário rubro-negro, em 1972, com a presença do ídolo rival Jairzinho dentro de campo, foi uma espécie de canto do cisne dos anos de ouro e da liderança rival no confronto. É curioso como os quatro jogos posteriores a essa goleada foram marcados pelo trauma emocional rubro-negro, que perdeu dois e empatou outros dois jogos, até que, num jogo isolado do Campeonato Brasileiro de 1973, a História voltou definitivamente ao seu curso normal.

No dia 9 de dezembro daquele ano, jogando para um modesto público de 27.759 pagantes, o Flamengo venceu o Botafogo por 1x0 com gol de certo cria da base, de nome Zico. A partir de então, a tendência que já havia se iniciado nos anos 70 tomou proporções maiores e o Flamengo, já naquela década, igualou o confronto para, a partir dos anos 80, devolver a goleada (6x0 em 1981), cobrar juros (6x1 em 1985) e superar o rival, disparando definitivamente na liderança das estatísticas. Desde então, o Glorioso teve seus melhores momentos no clássico em 1989 (roubado e quando Zico já havia sido substituído), 2010 e 2013 (Estadual), ao passo que o Mais Querido triunfou cabalmente em 1992, 2007, 2008, 2009 e 2013 (Copa do Brasil). Observem, porém, que nem mesmo nos anos 90, sem dúvida sua melhor década desde os anos 60, com um título e um vice-campeonato do Brasileiro, 1 Conmebol e 1 vice da Copa do Brasil, o Botafogo chegou perto de vencer mais vezes o clássico.

Também é interessante observar como, a partir da década de 90, há bem mais confrontos históricos entre Flamengo x Botafogo do que entre Flamengo x Fluminense, impressão que o post dos jogos mais importantes pode confirmar. Apesar do Fla-Flu ser inquestionavelmente muito maior, assim como o Fluminense é inquestionavelmente muito maior do que o Botafogo, o "Clássico da Rivalidade" tem um viés muito muito mais contemporâneo do que o Fla-Flu.

***

No começo do post chamei o Vasco da Gama de o maior entre os três rivais cariocas, porém "o maior rival" é uma expressão dúbia, que cabe tanto para designar o maior clube contra o qual se tem rivalidade, como também a maior rivalidade de um clube contra outros, condições que podem coincidir na prática, mas em tese são diferentes. Assim, apesar de particularmente considerar o Vasco da Gama um clube maior do que o Fluminense, preciso reconhecer que colocar a rivalidade do Clássico dos Milhões acima do místico Fla-Flu será sempre uma opinião extremamente polêmica, concordam? Então, como estamos aqui pra isso mesmo, respondam-me sem pipocar: para vocês, entre os três, qual é o maior em termos esportivos e qual é a maior rivalidade (torcida x torcida) contra o Flamengo?

Vivemos um momento mundialmente histórico e, claro, o futebol também passará por grandes mudanças. A julgar pela última década e os últimos anos, especialmente 2019, arrisco dizer que o futuro dos trio de rivais cariocas é nebuloso. Em razão disso, os dois últimos posts são a minha forma de homenagear esses três históricos oponentes e os grandes clássicos que, ao longo de mais de um século, disputaram contra o Mais Querido do Brasil. Neste momento da pausa, olhar para o passado, mirando o futuro, continua me parecendo uma boa forma de curtir o grande momento que vive o Clube de Regatas do Flamengo e acompanhar o que parece ser um inevitável processo de mudanças na hierarquia do futebol brasileiro.

Portanto, "medir" os adversários e situar a rivalidade em um contexto histórico ajuda a estabelecer metas e entender o tamanho dos desafios que o Mais Querido tem a sua frente. Todavia, como o Século XXI está sendo implacável com o trio de rivais cariocas, algo me diz que esses novos desafios não estarão mais no Rio de Janeiro e sim em outras fronteiras. Mas isso é assunto para outros posts...

A palavra está com vocês.

Bom dia e SRN a tod@s.