Olá, amigos do Buteco do Flamengo.
Faço hoje a minha estreia como colunista do blog.
Agradeço ao Rocco, ao Bcbfla e ao Gustavo pela gentileza do
convite.
Espero que minha participação ajude a manter o ótimo padrão
dos “posts” e comentários do Buteco.
SRN.
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Três de novembro de 1965.
Alguém me cedeu uma cadeira cativa para ver um jogo noturno
entre Flamengo e América, pelo campeonato carioca.
Foi a única vez que vi, de uma cadeira cativa, um jogo no
Maraca.
O América tinha uma “ala esquerda” infernal, com Edu, irmão
do Zico, e Eduardo, um ponta esquerda driblador e veloz.
Murilo, nosso lateral direito, começou o jogo levando um
baile.
Sobrava para Ditão, nosso zagueiro pela direita, obrigado a
sair na cobertura para impedir que Edu e Eduardo chegassem à nossa área.
Para tanto, precisava apelar para faltas que, cometidas por
um zagueiro grandão em jogadores leves e que se deslocavam em velocidade,
resultavam em quedas cinematográficas das vítimas.
O América já fizera um a zero quando Ditão, aos vinte minutos
do primeiro tempo, fez mais uma falta dura e foi expulso pelo juiz Frederico
Lopes.
Com justiça, reconheça-se.
Só que Ditão não concordou e partiu pra cima do juiz, que
resolveu encarar.
A turma do deixa-disso interveio e evitou que a coisa
piorasse.
E foi aí que eu vivi, como torcedor, uma noite mágica.
Mordido de inveja por não estar na arquibancada vi,
encantado, a torcida do Flamengo despertar e começar a carregar o time.
É um espetáculo que até hoje guardo na memória e que ainda me
arrepia quando conto a vocês esta história.
Dentro de campo, mais do que qualquer outro, agigantou-se
Carlinhos, o Homem do Violino, duas vezes campeão brasileiro como técnico do
Flamengo e, naquela noite, o herói do jogo.
Recuou para a zaga e dali, empurrado pelo grito incessante da
torcida, comandou a reação, com uma atuação irretocável como zagueiro e como
iniciador das nossas jogadas de ataque.
Nosso primeiro gol, de Almir Pernambuquinho, saiu aos 31 do
primeiro tempo.
O segundo, um gol contra do zagueiro americano Alemão, saiu
aos 29 do segundo tempo.
Com dez jogadores desde os vinte minutos do primeiro tempo, o
Flamengo virou o jogo e venceu por 2 a 1.
Na noite de 03 de novembro de 1965, Carlinhos deu uma aula do
que é ser jogador do Flamengo.
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Vinte e seis de fevereiro de 2020.
Maraca lotado, noite de decisão da Recopa 2020, expectativa
de jogo difícil contra o bem arrumado time do Independiente Del Valle.
Em campo, alguns jogadores com pouquíssima rodagem no time.
Léo Pereira, Gustavo Henrique e, a partir dos 21 minutos do
primeiro tempo, Thiago Maia.
Todos ainda sob restrições dos torcedores, porque suas
apresentações anteriores não haviam empolgado.
Pelo contrário, algumas atuações haviam deixado até a
preocupação de que os recém-contratados poderiam não alcançar o nível de
desempenho que se exige de cada jogador, no empolgante Flamengo dirigido por
Jorge Jesus.
Começa o jogo e as dificuldades esperadas se apresentam.
O time do Suco é bom e começa a testar nossas linhas.
O Flamengo, porém, tem Gabigol.
Uma bola meio vadia é atrasada pelo alto e, como comentou o
Rocco no pós-jogo, nosso artilheiro pressiona o zagueiro como se fosse um
tubarão pronto pra atacar.
O zagueiro se assusta com a presença do perigo, complica a
vida do goleiro e, como já virou rotina, gol do Gabigol.
Pouco depois, num lance desastrado, Arão levanta o pé no gogó
do adversário e é expulso. Aos vinte e um minutos, apenas um a mais do que a
expulsão do Ditão naquele jogo de 1965.
Começava ali o batismo de fogo do Léo Pereira, do Gustavo
Henrique e do substituto do Arão, Thiago Maia.
Porque não é só de técnica e de tática que se trata.
Trata-se também de, nos momentos críticos dos dias difíceis,
entregar-se à paixão que formou e tornou gigante a nossa Nação Rubro-Negra.
A história do jogo já foi contada em muitas versões e delas
consta que os três recém-contratados cresceram ao longo da partida e
multiplicando-se, como se multiplicou cada jogador do time, honraram nosso
Manto Sagrado, para que o Flamengo vencesse por 3 a 0 e, pela primeira vez,
conquistasse um título internacional dentro do Maracanã.
Acredito que, naquele momento difícil, aprendendo a superar
adversidades com muita entrega, os três começaram a entender com mais clareza o
que é ser jogador do Flamengo.
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O contrato que o Flamengo assina com seus jogadores é uma
relação de troca que, em si, nada tem de errada.
É assim que funcionam as relações de trabalho.
Ocorre que, uma vez contratados, há jogadores que se colocam
na posição de servir ao clube.
E há os que, infelizmente, às vezes com a leniência de
dirigentes inaptos, preferem dele se servir.
Os do primeiro grupo passam pelo Flamengo deixando sua marca
de dignidade e sempre são lembrados com respeito e carinho pela torcida do Mais
Querido.
Eu os vejo como os verdadeiros jogadores do Flamengo.
Eles nos representam.
Os do segundo grupo, por mais talentosos que sejam, não
conquistam nosso respeito e não deixam saudade.
Que o Manto Sagrado continue a inspirar nossos jogadores
atuais e futuros para que, como integrantes do primeiro grupo, contribuam para
a glória do Flamengo e da Nação Rubro-Negra e, agora e sempre, mereçam nosso
respeito e nosso carinho.
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Uma informação: Além dos sites de pesquisa e da minha memória
cheia de falhas, minha fonte de pesquisa de datas e detalhes é uma edição
antiga do Almanaque do Flamengo, de Roberto Assaf e Clóvis Martins. Nele, o
último jogo registrado aconteceu em julho de 2001. De lá pra cá, só mesmo os
sites de pesquisa e a memória.
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Amanhã, 04 de março, o Mais Querido estreia fora de casa, na Copa
Libertadores 2020.
Não espero moleza, porque não acredito nisso em jogos da
Libertadores.
Além de não contarmos com o Bruno Henrique, provavelmente teremos
Thiago Maia no lugar de William Arão e uma zaga muito renovada, composta por
João Lucas, Gustavo Henrique, Léo Pereira e Filipe Luís.
Thiago Maia, Gustavo Henrique e Léo Pereira tiveram, na quarta-feira
passada, seu batismo de fogo.
Amanhã, como comentou o Bernardo aqui no blog, pode ocorrer o
batismo do João Lucas.
Que o garoto se saia bem e que, mais uma vez, nosso time
consiga inspirar-se para jogar seu grande futebol e voltar da Colômbia com uma
bela vitória.