Saudações
flamengas a todos,
Findo
o relaxante descanso da Copa do Mundo, o Flamengo volta nos provocar,
mobilizar, fazer emergir nossas reações, sensações e emoções
mais primitivas, convidando-nos a sair do eixo ao nos expor as mais
diversas oportunidades de lidar com situações que, à primeira
vista, recendem completamente divorciadas de qualquer cântico
entoado pelo que se julgou denominar senso comum, testando nossos
limites, transportando-nos aos etéreos e cinzentos recônditos onde
repousam os últimos traços de sanidade.
Tava
fazendo falta.
Assim,
à guisa de reinauguração do hábito de construir estes rabiscos
semanais, deixo nas próximas linhas minha impressão de torcedor,
logo leigo, acerca de alguns assuntos que têm permeado a realidade
flamenga nesses meados do ano da graça de dois mil e dezoito.
Preocupado.
VINICIUS
JR.
Não,
não foi uma perda banal. A lacuna deixada pela saída do garoto,
mais que séria, foi grave. Porque, mais do que as recorrentes
demonstrações de sua luxuriante capacidade técnica, mais do que os
expressivos números inscritos nas publicações especializadas em
dados estatísticos, números esses que o faziam ombrear, ou mesmo,
em alguns casos, superar os festejados Neymar e Gabriel Jesus quanto
cotejados em mesma idade, mais do que a sua inequívoca importância
na trajetória do primeiro semestre, em que empilhou gols e
assistências nos mais diversos jogos, mais do que tudo isso, a maior
cratera deixada pela partida de Vinicius se dá em algo muito mais
subjetivo. É a frustração da alma.
Vinicius
Jr, mais do que identificado, encarnava a verdadeira personificação
do jogador do Flamengo. Cara de moleque marrento, folgado, abusado,
ignorando adversário, competição, estádio. Nutrindo pelo Flamengo
uma reverência quase religiosa, rapidamente galopava para a condição
de ídolo maior de uma Nação órfã desde 2009. Garoto de luz
própria, capaz de transformar em espetáculo midiático qualquer
pelada de aterro. Vinicius fazia notícia. Vinicius era a notícia.
Não por acaso, nele se galvanizavam as mais diversas reações de
ódio, inveja, ressentimento e recalque dos torcedores (entre eles,
jornalistas) de outros clubes. Porque, mais do que craque do
Flamengo, Vinicius era “o” Flamengo.
Não
houve tempo, mas Vinícius teria sido o ídolo de cuja falta nos
ressentimos desde 2009 (salvo um breve soluço com Ronaldinho). O
cara que estamparia o nome em milhares de camisas de adultos e
crianças. A referência. O craque.
Nesse
papel que cabe aos clubes brasileiros (sem exceção) de mero
exportador de matéria-prima barata para os europeus jogarem sua
“NBA”, não havia muito a fazer. O talento e a luz própria de
Vinicius eram de uma cintilância tão retumbante que soa de um
lirismo “poliânico” conceber ser possível retê-lo por aqui em
sua idade mais valiosa. E se foi.
Vai
com Deus, Vinicius!
REFORÇOS
Parecia
simples. Do time que terminou o semestre, houve duas saídas já
previstas, o já citado Vinicius Jr e o atacante Felipe Vizeu, e
outra baixa um tanto surpreendente, o volante reserva Jonas.
Especulava-se a possibilidade de mais três perdas, no caso o volante
William Arão, o lateral Trauco e o atacante Guerrero.
As
reposições pareciam equacionadas. Caso Arão (pouco utilizado na
jornada) de fato saísse, já havia o jovem (bem mais talentoso) Jean
Lucas, o que aliás traria até uma melhoria no plantel. A venda de
Vizeu abriria espaço para a ascensão de Lincoln, jogador em quem
repousam muitas expectativas. E o Flamengo conseguiu se antecipar ao
provável divórcio com Guerrero trazendo o colombiano Fernando
Uribe, atacante de bons números no competitivo (para os padrões
brasileiros) futebol mexicano. A venda de Trauco, apesar do enfático
esforço do próprio, acabou, por ora, não se concretizando,
eliminando a necessidade de reposição (fala-se aqui de reposição,
não upgrade). Restavam, portanto, as lacunas deixadas por Jonas e
Vinicius Jr.
E aí
começou o drama.
Compreensivelmente,
o Flamengo entendeu que, para a saída de Vinicius Jr, um jogador de
alto nível deveria ser trazido, até para prover o elenco de um
atleta capaz de emular os expressivos números produzidos pelo
precoce craque. E, depois de marchas e contramarchas, “elegeu” o
atacante Vitinho, rubro-negro declarado, que mantém com o clube um
longo flerte desde o final de 2016. Seguiu-se um dramalhão digno dos
novelões de priscas eras, uma história enjoativa, quase
insuportável.
Flamengo
acerta salário/contrato com o jogador, consulta o clube, assusta-se
com os valores e deixa que o jogador se entenda com seu empregador. E
espera. Enquanto isso, cede ao canto da sereia da ostentação de
novo-rico e pensa em trazer um jogador “de griffe”, selo europeu
de qualidade (vive sendo convocado para a Seleção de seu país).
Tal como ocorrera com Vitinho, acerta-se com o holandês Ryan Babbel,
mas se assusta com os valores pedidos pelo clube do atleta. E arrasta
uma negociação que dura semanas, sem resultado. E, quando
finalmente entende que Babbel, no frigir dos ovos, apenas desejava um
contrato melhor com seu clube, volta-se novamente para… Vitinho. E,
após mais algumas voltas e contravoltas, enfim o dramalhão parece
se encaminhar para um final satisfatório.
Só
que nisso passou-se uma Copa do Mundo inteira e mais dez dias de
troco. E contando.
Na
outra posição, o quadro se revelou ainda mais desolador. Porque,
após o problemático Walace permanecer no futebol alemão (trocando
apenas de agremiação), o clube aparentemente se resignou em
conceder a enésima oportunidade para Rômulo, que reiteradas vezes
tem demonstrado sua incapacidade de produzir futebol num nível
suficiente para pleitear fazer parte de um elenco como o do Flamengo.
Evidentemente,
a opção se revelou desastrosa e o preço foi cobrado.
Essa
semana, enfim, o clube parece dar sinais mais concretos de que
efetivamente logrará consumar as desejadas reposições. Caso os
sólidos rumores recente não se esfumem em novas novelões
cansativos, o Flamengo terá à sua disposição, além do já citado
Vitinho, um volante paraguaio de Seleção e uma obscura promessa
revelada em um centro menor, cuja contratação já se reveste
polêmica, por conta de algumas peripécias desagradáveis do garoto
nas redes sociais e de seu duvidoso estado físico.
As
reposições, enfim, sairão da cartola. No entanto, impossível
deixar de manifestar desapontamento e preocupação com a condução
de todo o processo por parte da Diretoria. A realidade atual é que o
time voltou da Copa mais fraco do que antes, chegando a apresentar
deficiências que pareciam sanadas.
Haverá
um lapso para incorporar os novos jogadores ao elenco. E,
incorporados, ainda surgirá a questão da adaptação, do encaixe,
essas coisas.
Que
esse lapso temporal não sepulte a temporada do Flamengo.
CAMISA
AZUL
Antes
de encerrar, breve observação sobre o terceiro uniforme, que
estreia hoje à noite, segundo informações.
É
irrelevante emitir juízo de valor acerca da “beleza” da camisa,
visto que subjetivo. Usar azul, cor que possui ligação histórica
com o clube, também soa razoável, embora talvez fosse mais razoável
sempre “casá-la” com o amarelo (ou dourado), para ratificar essa
identidade de contexto. “Quebrar uma tradição” de “nunca ter
jogado de azul” igualmente é um argumento que ganha fissuras
diante do cotejo com a informação de que, na noite de 18 de
fevereiro de 1977, o Flamengo disputou um amistoso no Estádio
Nacional do Chile trajando camisas azuis e calções brancos, para
evitar o choque de contraste com as camisas vermelhas da Seleção
Chilena, seu adversário no prélio.
A
questão que se coloca não é, portanto, de “quebra de
identidade”, “fuga das raízes” ou “camisa feia/bonita”. É
algo um tanto mais delicado.
Ao
final do ano haverá eleições, que se anunciam renhidas, duras, com
dedo na cara e cadeira voando. Fazer o time ir a campo ostentando uma
camisa azul, cor que caracteriza a Situação, justamente em um ano
eleitoral, soa algo evitável e desnecessário. E sabemos que em
política pode-se atribuir tudo a qualquer coisa. Menos à
ingenuidade.
Ficou longo. Paro por aqui.
Boa
semana a todos,