Saudações flamengas a todos,
Hoje
se inicia a temporada 2018, com a estreia do Flamengo no Campeonato
Estadual, outrora “charmoso”, hoje controverso. Desde a fatídica
decisão da Sul-Americana, muito já se foi falado, marretado,
lamentado, cornetado. Ergueu-se uma espécie de consenso, ou se comum
senso, de que o Flamengo irrompe o novo ano vestido do mais baixo
nível de expectativa externado por sua gente em muito tempo.
Há
quem enxergue bom augúrio nisso de “baixar a bola”, ou quem,
recorrendo a laivos de memória cada vez mais rarefeitos na massa
comum, recorde-se de momentos em que o clube logrou erguer taças
após prelúdios pouco altaneiros (embora também exista farta
“jurisprudência” que igualmente narre enredos de final distinto,
ou seja, não saiu nada de onde nada se esperava mesmo). Para cada
2009 há um 2005 invocando a contradança. Destarte, não vejo ser
prudente fundar-se nesse terreno.
Então,
sem delongas, o que esperar desse Flamengo?
Em
que pese a espessa nuvem de desconfiança e frustração que insiste
em repousar em nosso firmamento desde o ainda inesquecido Gasômetro,
há alguns aspectos que podem ser recepcionados de forma positiva.
O
Flamengo inicia a temporada retendo a espinha dorsal de um elenco
qualificado. Jogadores de nível perfeitamente compatível com a
expectativa de colher resultados de nível elevado dentro do
verdadeiro pântano de mediocridade que se espraia no ambiente do
futebol praticado na “terra brasilis”. Há vários jogadores que
teriam espaço de protagonista em qualquer equipe nativa, dentro de
uma perspectiva de análise individual e de currículo, em que pese o
fraco, como um todo, desempenho individual e coletivo demonstrado por
vários deles ao longo da temporada passada.
Também
há os jovens. A breve consultoria do fujão Reinaldo Rueda deixou um
legado que, aos ouvidos mais sensíveis, até hoje ainda grita e
reverbera. O Flamengo precisa ser mais assertivo no uso das suas
divisões de base. Se o clube conseguiu encerrar sua temporada de
forma ao menos digna, posto que frustrante (chegar a duas finais e
encetar a classificação direta à Libertadores pode, sim, ser
encarado com certa altivez, apesar de pantomimas desnecessárias como
a tal foto do Barradão), isso muito se deve à guinada em direção
à base promovida pelo alienígena colombiano. Com efeito, Paquetá,
Vizeu e Vinícius Jr protagonizaram momentos decisivos na reta final,
com gols, assistências e lances efetivamente decisivos. Estão
prontos para participar da rodagem do elenco, embora ainda padeçam
de certa instabilidade, que tende cada vez mais a ser mitigada. E,
como os citados, certamente há mais garotos aptos a iniciarem esse
processo. E os primeiros sinais iniciais emanados pela Gávea talvez
apontem para uma certa receptividade à retomada desse caminho.
Por
fim, a tal “limpa”. Ou “barca”. Dessa vez, o clube aparenta,
efetivamente, demonstrar um mínimo de senso crítico, ao promover a
dispensa de alguns jogadores cujos serviços já não encontram
compatibilidade com os anseios de uma instituição do porte do CR
Flamengo. Com efeito, jogadores “úteis” e “de elenco”,
incapazes de apresentar desempenho consistente de alto nível,
começam a ser descartados, abrindo espaço para o aproveitamento de
jogadores “da casa” e para a contratação de profissionais
realmente capazes de agregar performance. Porque um Márcio Araújo,
um Gabriel, um Rafael Vaz (jogadores cuja contribuição até foi
necessária em outros contextos, mas que se tornaram, pelo futebol
e/ou pela postura, um estorvo) podem perfeitamente serem garimpados
dentro dos muros do Ninho do Urubu. E, além dos jogadores, alguns
profissionais da comissão técnica também foram desligados ou
esvaziados, o que pode indicar que, de fato, o clube foi capaz de
identificar descontentamento com o funcionamento de seu Departamento
de Futebol.
Mas,
porém, contudo, entretanto, todavia, e deixo aos amigos a opção de
escolherem a conjunção adversativa que mais lhe convierem, há
aspectos que não podem deixar de ser considerados.
O
primeiro desses elementos reside na própria política de
contratações. Em que pese o CR Flamengo singrar em direção ao
SEXTO ano da administração azul, celebrada, como se sabe, pelo
êxito na reestruturação da instituição, ainda soa
incompreensível que o rubro-negro ainda precise recorrer, de forma
quase exclusiva, ao surrado expediente de forçar aquisições de
jogadores sem despender um centavo. Com isso, muitas vezes chegam ao
clube jogadores com histórico de lesões, em baixa ou mesmo
decadentes. Ademais, determinadas negociações acabam por se
arrastar por semanas ou meses, comprometendo a formação de um
elenco homogêneo e com peças de reposição adequadamente
preparadas.
Ainda
pousando no quesito “reforços”, a Diretoria parece reverberar,
de forma pétrea, o dogma das “contratações de oportunidade”.
Ou seja, se um jogador está disponível no mercado e a transação
aparenta ser vantajosa, que venha. É um pensamento traiçoeiro, uma
vez que enseja, à guisa de nocivo corolário, a conclusão de que,
se não há “oportunidades” para determinada carência, esta não
será suprida. Exemplos que ainda se estampam em nossas lembranças,
como a falta de peças para a zaga no início do Brasileiro de 2016,
a ausência de reposição para a lesão do Diego no primeiro
semestre de 2017 (o clube confiou em Conca, que se apresentava como
“aposta de oportunidade”), ou a falta de um reserva adequadamente
preparado para o gol, quando Alex Muralha começou a demonstrar a
falta de condições de seguir como titular. Agora, em 2018, a
perspectiva de repetição dessas anomalias (que, nunca é demais
pontuar, provavelmente terão sido decisivas para o fracasso nas
principais competições das duas temporadas passadas) projeta sua
sombra nas laterais (com a aparente desistência na contratação de
Zeca, o Flamengo não acena com alternativas) e, principalmente, no
comando do ataque. Com Guerrero suspenso e a negociação pela vinda
de Vágner Love (o eleito pela Diretoria) dando sinais de que seguirá
emperrada por um bom cacho de dias, há uma possibilidade real de que
o Flamengo chegue, daqui a pouco mais de um mês, à Libertadores
ostentando severas limitações em algumas posições de seu time
titular. E, como o já citado Gasômetro nos mostrou, é o tipo de
contexto que fatalmente cobrará seu preço.
Outro
incômodo brota da forma de atuação da Diretoria, especialmente de
seu Diretor-Executivo, Rodrigo Caetano, que, com a emigração do
“cafetero” para as terras andinas, aparentemente irrompe como o
nome forte do departamento. Após a saída de Rueda (algo, aliás,
anunciado desde dezembro para quem acompanhou atentamente a riqueza
de detalhes na narrativa da imprensa chilena), o Flamengo “agiu
rápido” e trouxe Paulo César Carpegiani, cujo currículo
pós-Flamengo 81-82 chama a atenção pela inexpressividade, em que
pese razoáveis trabalhos recentes em clubes de porte menor.
Independente da discussão acerca da capacidade de Carpegiani,
intriga buscar decifrar qual o critério seguido pelo clube para a
escolha do profissional. O Flamengo, no espaço de doze meses,
apostou em um jovem talentoso, mas inexperiente, depois recorreu a um
estrangeiro rodado e de currículo robusto, e agora traz um
“dinossauro” old-school, que jamais se firmou como treinador
efetivamente de ponta no cenário nacional. A confusão, quase
incredulidade, ganha contornos faiscantes quando se depara com as
declarações exaradas na apresentação de “Carpa”, que permitem
inferir, com razoável convicção, de que o rubro-negro inicia 2018
dirigido por um interino.
Há
mais. Se é verdade que a Diretoria, ao substituir determinados
profissionais da comissão técnica, demonstra aparente
descontentamento com seu desempenho, também causa estranheza
constatar que alguns deles “saíram sem ter saído”, ou
simplesmente seguem no clube, apesar de esvaziados. A percepção
(que pode ser procedente ou não) aponta para uma certa falta de
convicção na execução de determinadas ações. Percepção que se
fortalece quando se constata o evidente papel da “opinião pública”
(ou redes sociais, como se queira) na contratação, ano passado, de
nomes como Rueda e Diego Alves. É bom ouvir a “voz rouca” das
ruas. Mas usá-la como bússola, per se, demonstra preocupante falta
de certezas. E de rumo.
Enfim,
é um Flamengo envolto em incertezas este que hoje inicia sua
caminhada na Temporada 2018. Um ano que se espera menos sofrido e
frustrante, um ano em que se sonha com um clube que, enfim, abrace
sua vocação de comprometimento com a índole de perseguição às
vitórias, que encharque camisas e estenda a mão à sua gente. Que
seja capaz de fazer brotar jogadores identificados e prontos a atrair
admiração e idolatria. Que, enfim, torcer pelo Flamengo nos faça
felizes, capazes de cantar a alegria de ser rubro-negro.
Afinal,
é nosso maior prazer vê-lo brilhar.