Senhor Presidente,
Qual o
problema? Por que o nervosismo? O desarvoramento?
Vamos
começar do começo. A gente pode discutir qualidade de jogador,
nível de treinador, dar pitaco até mesmo no trabalho de executivo,
de diretoria, de gerente. Sim, temos como discorrer longamente sobre
qualquer assunto que a gente não domina. Cornetar preparador físico,
médico, treinador de goleiro, qualquer coisa. Afinal, o google e o
wiki estão aí pra nos ajudar. No entanto, apenas uma coisa, Senhor
Presidente, apenas e tão somente um único elemento não pode ser
contestado, questionado, alvejado.
O
resultado, Senhor Presidente.
O
resultado é o juiz, a divindade que imprime de forma indelével nos
profissionais da bola o carimbo do êxito ou do fracasso. Nenhum,
absolutamente nenhum trabalho poderá ser considerado bem-sucedido
sem a irretorquível chancela do resultado. O resultado é educativo.
O resultado indica caminhos. O resultado é o senhor absoluto dos
esportes de competição, é o juízo final, é o elemento que erige
ou destroi currículos, carreiras, vidas. Naturalmente, os mais
renitentes recorrerão ao surrado artifício da relativização e do
subterfúgio, seja para amaciar fracassos, seja para embotar
conquistas. Mas, com o tempo, a mensagem fria, objetiva e seca do
resultado prevalecerá. É o que se perpetuará na história. Não é
prudente confrontar os resultados.
E os
resultados, Senhor Presidente, estão ruins.
UMA
vitória em SEIS jogos. Campanha de rebaixado.
Um bom
planejamento, Senhor Presidente, não é aquele que provê o desfecho
ipsis litteris conforme preconizado meses antes. O planejamento bem
feito, redondinho, é aquele que traz a perspectiva de
desenvolvimento de ações corretivas aos primeiros sinais de ruídos.
Planeja-se, executa-se, afere-se e, quando for o caso, atua-se para
corrigir o rumo. Isso está escrito em qualquer livro básico de
administração, Senhor Presidente. Quero crer que o senhor saiba
disso.
Não é o
caso, não daqui de fora, de apontar o dedo. Mas se trata, sim, de
ver os sintomas. Porque há muitos sinais. Senhor Presidente, o
Donatti saiu do time no mesmo dia que o Diego. 12 de abril.
Desconforto na panturrilha, ou algo do tipo. Pois, estamos em junho,
Senhor Presidente. Junho. Dois meses. O Diego foi operado e já
voltou, taí jogando. E o Donatti nada, Senhor Presidente. E o
Berrío? Tomou um totó na perna e já vai pra um mês que mal
treina. E ninguém fala nada, ninguém dá uma satisfação. Tudo
muito escondido, tudo muito fechado. O Conca veio pra ficar pronto em
maio (chegou a ser inscrito pro Estadual e Libertadores), estamos em
junho e o cara segue gordo e mancando. O Senhor viu a barriga do
Arão, Senhor Presidente? Viu a forma roliça do Vizeu domingo?
Lembrou o Obina. Aliás, cadê a Exos, Senhor Presidente? Uns dizem
que já se foi, outros falam que ainda estão prestando serviço ao
clube. Mesmo uma informação banal como essa sai truncada, ninguém
sabe de nada, ninguém tem a explicação concreta, Senhor
Presidente.
Há mais.
Os reforços. Em tese, cobrindo algumas das deficiências do elenco e
repondo saídas. Mas, tal como ano passado, os reforços não jogam.
São relegados a papeis secundários. Mesmo tendo custado caro. O
Senhor não acha estranho, Senhor Presidente? Temos hoje um elenco
muito bom, um dos melhores do país, recheado de opções, e um time
titular com várias deficiências. Suspeito que o time reserva do
Flamengo hoje chegaria à frente do titular na maioria das
competições que disputasse.
Eu sei,
Senhor Presidente. Quem escala é o treinador.
Aliás,
não sei se o senhor sabe, Senhor Presidente, mas o trabalho do Zé
Ricardo, aquele fundamentado nos conceitos e premissas de 2016,
acabou. O ciclo está no fim. Aquele time, com aquela forma de jogar,
com aqueles jogadores-chave, não vai dar mais nada. Urge iniciar um
novo ciclo. Com o mesmo treinador, como o Senhor quer, é difícil.
Já aconteceu com o Carlinhos duas vezes (ressuscitou depois de duas
pesadas crises em 87 e 92), mas é complicado. Enfim, um novo ciclo,
com novas premissas, novo time-base, novas peças-chave (muitas delas
já no próprio elenco) precisa ser iniciado, com ou sem o Zé
Ricardo. Só tem um problema. Precisamos de um trabalho vencedor. Com
índole ganhadora. Capaz de perseguir o êxito.
Aí
chegamos aonde eu quero, Senhor Presidente.
Não há
qualquer problema num líder demonstrar confiança em seus
comandados. Aliás, é algo desejável às vezes, pois é importante
injetar moral, fazê-los sentir-se parte importante do trabalho. No
entanto, Senhor Presidente, um ou outro elogio esporádico é algo
completamente diferente de se derramar em loas emotivas a quem lhe
deve satisfação. O elogio fofinho e fácil é peçonhento, Senhor
Presidente. Corroi o ambiente. Traz em seu bojo a acomodação. Faz
brotar profissionais mimados. Dormentes. Sem compromisso com a
perseguição às vitórias. Inerte. Indene.
Um
dirigente, Senhor Presidente, é o Chefe. O “hômi”. Aquele a
quem se deve obediência hierárquica. Afeiçoar-se e demonstrar
apreço por seus liderados é o caminho mais curto para criar um
ambiente corrompido. Lasso. Descompromissado. Incompatível com as
expectativas criadas por milhões e milhões de torcedores espraiados
pelo País. “Mas há cobrança no Departamento”. Sim, pode até
haver, até creio que haja (de fora, não sabemos), mas me responda,
Senhor Presidente, mesmo se algum diretor ou gerente aperta os
jogadores, qual o efeito prático disso, se o cabeça, o líder
maior, o dirigente máximo, esforça-se de maneira quase infatigável
em lustrar o desempenho dos profissionais a seu comando? Em dourar
pílulas? Em passar pano?
Senhor
Presidente, o que queremos é que o Senhor converse com a gente.
Falar que ficou “triste” com a derrota não irá criar esse
canal. O Senhor é incapaz de apontar a mais remota fissura, a mais
desprezível anomalia, o mais milimétrico problema em público,
Senhor Presidente. Nem ao menos de forma abstrata. Quando o Senhor
fala que “está tudo bem”, “não vamos mudar nada”, a
mensagem transmitida é a de conformismo. De resignação. De postura
bovina. E creia, Senhor Presidente, esse recado tem um efeito muito
mais poderoso da porta pra dentro. Porque aqui fora muitos vão
gritar, espernear, vociferar, desprezá-lo, mas lá na frente
esquecem ou acham outro assunto para se distrair. No entanto, da
porta pra dentro esse recado é assimilado. Porque ali não é o
Senhor que está falando. É o Flamengo. É o Flamengo que avisa que
“está tudo certo”.
E aí
aparece a barriga do Arão, a pança do Vizeu, a marra ressentida do
Márcio Araújo...
Senhor
Presidente, o momento pede ação, não palavras carinhosas.
Contrate. Demita. AJA. Anuncie em público que não está satisfeito.
Critique o time. Nem precisa colocar o dedo na cara, use mensagens
cifradas, entrelinhas. Mas demonstre incômodo. Reconheça falhas. E,
pelo amor das divindades, PARE de distribuir afagos, elogios e
palavras divorciadas da realidade. Liberte-se das amarras da
mediocridade e do pensamento pequeno.
Represente-nos,
Senhor Presidente.
Senhor
Presidente, o Senhor não governa apenas para seus correligionários.
A torcida do Flamengo não se resume a alguns milhares de
Sócios-Torcedores. Não adianta falar em “meia-dúzia” de
protestos (aliás, discurso pronto dos dirigentes “das antigas”).
Não faz sentido praguejar contra as “faixinhas profissionais”. E
se realmente houve viés político dos oportunistas e cassandras de
sempre? Qual o problema? Um dirigente não pode se meter em briga de
rua com o primeiro detrator. O Senhor está despido da sua condição
de pessoa física, Senhor Presidente. No exercício do cargo, o
Senhor representa o CR Flamengo. O CR Flamengo não sai na mão com
sua torcida. Protestos, políticos ou não, fazem parte da história
do clube. Um elenco caro e montado para disputar o título brasileiro
e, ao cabo de seis jogos, aparece nas franjas da Zona de
Rebaixamento. E o Senhor quer aplausos, Senhor Presidente? Em qual
tipo de realidade paralela sua entourage o imergiu, Senhor
Presidente?
O Senhor
gosta de aludir à sua condição de torcedor. Costuma escalar times
campeões de outros tempos, lembra-se de momentos da nossa história,
e coisa e tal. Eu lhe pergunto, Senhor Presidente. Estivesse o Senhor
desatado de sua condição de dirigente, estivesse o Senhor
frequentando as arquibancadas e vendo a equipe desfilar esse futebol
indigente, apático, burocrático e incompatível com o nível do
elenco de que dispõe, o Senhor estaria batendo palmas, Senhor
Presidente? Sendo “compreensivo”? Ou estaria xingando alguém?
Quem seria seu alvo, Senhor Presidente?
Encerro
com uma constatação algo óbvia. Suas reações recentes
desvairadas, sua agressividade, seu viés emotivo para descarregar
algumas respostas desnecessariamente atravessadas, seu ímpeto em se
reconhecer incapaz de assumir erros, tudo isso somente traz uma
conclusão
bastante clara.
Não foi
“só mais uma derrota”.
Sem mais,
Senhor Presidente.