O
prejuízo parece incalculável.

No
entanto, em vez de um Maracanã com 100 mil numa Semifinal de
Brasileiro, o lodoso gramado da gelada Blumenau. Amistoso
caça-níqueis catado de urgência.
Não sem
responsáveis.
A
culpa recai sobre o o treinador Zagalo, que teria
subestimado os adversários de um grupo teoricamente fraco. O Bahia,
único oponente razoavelmente respeitado, foi inapelavelmente batido
no Maracanã (3-0), e se pensou que tudo estaria resolvido. Aí veio
Pelotas. E a tragédia.

A saída
de Zagalo encerra uma contradição. Após a perda da vaga no
Brasileiro, Helal chamara a imprensa para avisar, com todos os efes e
erres, que estaria a partir de então assumindo a responsabilidade
“única e indelegável” pelo futebol. “A partir de agora, sou o
presidente, o vice e o diretor de futebol do Flamengo”. No entanto,
o responsável “indelegável” declara ter sido “voto vencido”
na demissão do Lobo. Os desavisados não entendem.
O
Flamengo segue em seus delírios de fartura. Cogita contratar Éder,
Renato Gaúcho, Marinho (Bangu). Negocia a troca de Serginho Chulapa
pelo centroavante Chiquinho (que, apesar do mau desmpenho na Gávea,
possui prestígio no futebol paulista). Transações que não são
levadas adiante por falta de perspectivas financeiras. O segundo
semestre acena com um Estadual provavelmente deficitário e mais
nada. A realidade impõe se desfazer do caro e problemático Fillol
(que falhou nos dois gols em Pelotas), vendido ao Atlético Madrid.


Reduzir
Edu à pecha de “irmão de Zico” soa simplista, raso, pela
intensa luz própria de seu currículo. Como jogador, construiu uma
carreira brilhante em um América que disputava títulos contra os
melhores do país. Virou ídolo e um dos maiores atletas da história
do clube rubro. Após parar, tornou-se treinador. Novamente no
América, conquistou a Taça Rio de 1982, o último troféu de
expressão da história americana. Revelou nomes como o lateral
Jorginho. Montou um time veloz, compacto e de futebol vistoso,
ofensivo. Chamou a atenção do Vasco, para onde se transferiu em
1984. Com um time leve, de um ataque devastador, chegou ao Vice
Brasileiro, o que lhe abriu caminho para uma experiência na Seleção
Brasileira onde, ainda imaturo, não foi bem. Agora, Edu chega ao
Flamengo com o objetivo de implantar na Gávea o mesmo futebol bonito
e alegre que pontuou sua carreira. E que “casa” de modo perfeito
com o rubro-negro.

Cai a
tarde.
Vultos.
Muros. Latas de spray. Pichações. Barulho, muito barulho. Fogos.
Pedras na vidraça.
Os muros
da Gávea estão emporcalhados e rabiscados com mensagens enfáticas.
“EDU NÃO”. “FORA EDU”. “EDU É DERROTA”. “EDU
VASCAÍNO”. “MARAJÁ”.
Com
rapidez impressionante, surgem câmeras por todo lado. O protesto é
fartamente documentado. Vai pro Jornal Nacional, que dá duas linhas
sobre a contratação de Edu e longos minutos sobre o protesto.
Torcedores são entrevistados falando mal de Edu. A Rádio Globo, em
seus plantões, bombardeia a contratação de Edu. Mais torcedores
aparecem criticando. “A diretoria insiste em trazer um treinador
que é repelido pela torcida”.
A
madrugada será o bálsamo de merecido repouso. Para alguns.
Manhãzinha.
Telefones badalam estridentes. Reunião de emergência é marcada.
Mais tumulto à vista.
Edu
Antunes avisa ao Flamengo que desiste de ser seu treinador.
Assusta-se com a repercussão negativa e resolve aceitar uma
proposta, que já havia recusado mas ainda não fora retirada, para
dirigir a Seleção do Iraque. Para o lugar do “irmão de Zico”
assumirá o auxiliar Joubert Meira, que irá para sua terceira
passagem no clube.

E há um
elemento relevante. A Globo, irritada por ter sido preterida pela
Rede Manchete na cobertura do processo de retorno do Galinho, mantém
linha editorial bastante crítica em relação ao jogador. Conseguiu
emplacar o folclórico Jacozinho no amistoso festivo do Galinho,
atrapalhando e ofuscando o evento. No dia da eliminação do Flamengo
no Brasileiro, ostentou uma gigantesca foto no jornal mostrando um
Zico cabisbaixo e de joelhos. No cotidiano, tem amplificado algumas
declarações mais críticas do Galinho, elevando a manchetes que
podem trazer potencial teor polêmico.
E a Globo
dá especial atenção à reação contra a vinda de Edu. Reverbera
em tom talvez desproporcional, em tevê, em rádio. Há uma ênfase
em cravar que o “irmão de Zico” não serve para o Flamengo, que
se tornará uma “bagunça” e “refém” de um jogador. Fala-se
em “pisar na história do clube”.
No dia
seguinte, os jornais afirmam que “a torcida não deixou Edu
assumir”. Ironicamente, a mesma (a mesma?) torcida que, pouco mais
de uma semana antes, havia brindado o Maracanã com o coro de
“Eduuuu, Eduuu, Eduuu”, no final do jogo em que o Flamengo
empatara com o Ceará (2-2) pelo Brasileiro. O que teria mudado desde
então? Talvez o fato de que a manifestação do estádio tenha sido
espontânea.

Joubert
assumirá o Flamengo com um dos mais duros discursos registrados por
um treinador recém-contratado. Defende que “a partir de agora,
todos os onze precisam correr e marcar”, “futebol mudou, precisa
de transpiração. Talento é dispensável”, “jogador precisa do
corpo, não pode ir a teatro, restaurante. Não pode ter vida
social”, entre outras posições, no mínimo, controversas.
Não
durará muito.

Tal como
no episódio de Edu, a “torcida” terá papel relevante e mesmo
decisivo como instrumento de pressão. A partir desses casos, a
“torcida” perceberá que o uso de uma linguagem assertiva,
agressiva e mesmo violenta poderá render dividendos. Será
estimulada. Financiada. Crescerá.
E será
uma personagem cada vez mais ativa na política do clube.
Talvez
ativa demais.