Irmãos rubro-negros,
Não quero, nesta coluna, adentrar a enorme lista de equívocos deste segundo mandato da diretoria.
Não quero falar das eliminações humilhantes deste ano de 2016, nem mesmo a da Copa do Brasil, a pior participação do clube na história da competição.
Não quero falar das derrotas para times da Segunda, Terceira e Quarta Divisões do futebol brasileiro.
Não quero falar do planeJUmento feito para o ano de 2016, que culminou na situação esdrúxula do time contar, em pleno andamento do Campeonato Brasileiro, com apenas três zagueiros, um dos quais reintegrado após ser dispensado e dois juniores.
Não quero falar das promessas de campanha, a tal "reformulação total do departamento de futebol", que se limitou à contratação do Muricy, à contratação de seis ou sete jogadores e à melhora das condições de trabalho, mantendo-se intacta, porém, a estrutura de gestão, comando e condução do departamento de futebol.
Não quero falar das "negociações avançadas" para a construção de um estádio na Ilha do Governador, negociações essas que nunca ninguém viu uma linha ou soube de uma reunião sequer. Muito pelo contrário, do que ficamos sabendo, posteriormente, já neste ano, é que, enquanto a diretoria, então em efervescente campanha eleitoral, alardeava interesse e "negociações avançadas" para o estádio na Ilha, ela, a diretoria, já havia, em julho do ano passado, expedido ofício à CBF solicitando que Brasília fosse a sede do clube em 2016. Em resposta, ouviram um sonoro "nao". Mas fica a dúvida: se estavam em "negociações avançadas" para um estádio na Ilha, por que fizeram, ainda em julho de 2015, requerimento oficial por Brasília?
Não quero falar dos patrocínios que, às vésperas da eleição, estavam muito "bem encaminhados", pois as condições seriam "mais fáceis". Realmente, como todos nós sabemos, a economia e a política brasileiras planaram em céu de brigadeiro no ano passado, tudo se modificando, repentinamente, no dia 08 de dezembro de 2015. Todas as dificuldades encontradas para fechar patrocínios eram imprevisíveis às vésperas da eleição. A economia ia muito bem. Por isso, a dificuldade da diretoria em alcançar as metas de patrocínio previstas, que eram bastante "realistas", dado o cenário à época.
Não quero falar do brado forte, retumbante, que ressoou durante todo ano passado, e que dizia textualmente: "o Flamengo não disputará o Campeonato Carioca com o time titular." Faltou, contudo, combinar com o restante da turma. A Globo vetou e a diretoria botou o rabinho entre as pernas e tratou de colocar o time titular para jogar o Estadual. Mas a desculpa pronta, essa não faltou, como não falta nunca em se tratando da atual diretoria. Arrumaram logo um jeito de culpar o novo executivo de futebol da Globo. Foi ele, lobo mau, que voltou atrás no "acerto verbal", que ninguém nunca viu, naturalmente, e obrigou o clube a disputar o Carioca com o time principal. Como imaginar algo assim, não é mesmo? Uma emissora que paga milhões por uma competição e o clube mais importante quer sabotá-la. Como não apoiar uma iniciativa dessa? A Globo é uma traidora, que depositou muito bem vindos setenta milhões de reais na continha do clube pela renovação dos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro.
Não quero falar daquele papo aceso, turbulento, que incendiou a campanha eleitoral, sobre as tais cotas igualitárias da Liga. Em princípio, a diretoria e seus apoiadores garantiram: "não existe nenhuma possibilidade da cota ser igual; o Flamengo ganhará mais que os outros." Mas não é que, na hora de assinar os papéis, acabou que as cotas foram iguais para a todos? Mas a desculpa, a justificativa, essa sabemos que não falha jamais. Arrumaram rapidamente uma maneira de, em evidente malabarismo retórico, fazer uma muito conveniente distinção entre "cota e direitos de transmissão", e com uma lógica que convenceria até um babuíno, mostraram, por A + B, que o Flamengo, por ser o clube de maior torcida e maior audiência, ganharia muito mais explorando as placas de publicidade de estádios vazios do que recebendo cotas proporcionais ao tamanho de sua torcida.
Não quero falar da altíssima folha salarial do clube, que verte recursos em jogadores como Emerson, Pará, Márcio Araújo, Fernandinho, Chiquinho, dentre outros.
Não quero falar da contratação de dois jogadores, Antonio Carlos e Arthur Henrique, que sequer vestiram a camisa do Flamengo e já foram dispensados.
Não quero falar da promessa, feita há menos de um mês atrás, após sucessivos fracassos e a mais vergonhosa participação do Flamengo na história da Copa do Brasil, de que seriam feitas "mudanças profundas" no departamento de futebol. Transcorridos trinta dias da declaração, a única mudança feita foi a promoção do promissor técnico dos juniores, Zé Ricardo, para o profissional.
Não quero falar do inconsequente convite feito ao Ricardo Rocha para assumir o cargo de gerente de futebol do clube e da posterior sondagem feita a...Fabinho. Fabinho, meus amigos. Vocês têm noção disso?
Não quero falar da irresponsabilidade do presidente, ao aceitar convite para representar Marco Polo del Nero e a CBF na Copa América dos EUA.
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Hoje, meus amigos, não falarei de nada disso.
Hoje eu quero falar da maior invenção dessa diretoria. Uma das maiores invenções da história do futebol mundial.
Algo que nenhum clube do mundo aplica, seja aqui ou na Europa, seja no futebol, no basquete ou no vôlei, mas que revolucionará o desporto mundial.
Hoje eu quero falar da "teoria da zona mista".
Num golpe frontal contra a barbárie, a guerra e o espírito belicoso que têm tomado conta do futebol em todo o mundo, sobretudo na Alemanha, na Espanha, na Itália, na Inglaterra e em Portugal, a diretoria do Flamengo, dando mais um exemplo incomparável de fidalguia e covardia, digo, cortesia, destinará para os torcedores adversários, sempre que o clube tiver o mando de campo, todos os ingressos que lhes apetecerem comprar, inclusive com direito, a depender do número de ingressos vendidos, a ter o hino executado pelos altos falantes do estádio.
É algo realmente genial, que mudará para sempre as regras de convivência.
Quanto ao torcedor rubro-negro, que apanha, toma cusparada e fica espremido quando acompanha o Flamengo fora de casa, fica a mensagem: não é porque você sofre toda sorte de indignidades que a diretoria vai imitar essa política malévola e cruel de limitar os ingressos da torcida adversária ao mesmo percentual que nos destinam quando somos nós os visitantes.
Não, isso é pensar pequeno.
Para quê proporcionar mais conforto ao rubro-negro, que gosta tanto de estar entre os seus em sua casa, se a diretoria pode fazê-lo mudar de lugar (como ocorreu com o Gustavo, suas filhas e sua irmã, no jogo de domingo passado), ouvir piadas e gracejos dos adversários e até, quem sabe, com um pouquinho de sorte, levar um gás de pimenta nos olhos?
O torcedor do Flamengo precisa aprender o que é a vida. Precisa acordar para a realidade. Ficou muito mal acostumado lotando estádios dentro e fora de casa e empurrando o Flamengo para vitórias e títulos inesquecíveis.
Os dirigentes, que viajam de avião, sentam em camarotes e estão sempre acompanhados de seguranças, querem o melhor para o humilde torcedor do Flamengo.
Visando a esse desiderato, além, claro, da grande lição moral para toda a humanidade, a diretoria prestará, com a tal "zona mista", relevante serviço para o torcedor do Flamengo, que será, cada vez mais, forjado na luta e na dificuldade, pois terá de brigar por respeito e pelo seu lugar dentro e fora de casa.
Como ninguém teve idéia tão salutar antes?
A verdade, meus amigos, é que as mentes brilhantes não surgem em cada esquina, a cada segundo. E a diretoria atual é farta em mentes brilhantes, que entendem tudo de Flamengo, de rivalidade, de disputa, de glórias.
Naturalmente, e para finalizar essa breve explanação, a adoção plena e imediata da "zona mista" trará algum ganho financeiro, coisa secundária, de pouco importância, mero reflexo de uma política que será reconhecida, no futuro, como a maior invenção da história do desporto mundial.
Idéia de jênio.
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Abraços e Saudações Rubro-Negras a todos.
Uma vez Flamengo, sempre Flamengo.