domingo, 1 de maio de 2016

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos,

Antes de iniciar o texto, transcrevo aqui um comentário do colega Heriton Castello Branco, publicado na coluna de domingo passado, sobre goleiros. Ele falava de um vídeo postado pelo Gustavo Brasília.

Faltou um lance, se eu não me engano contra o Serginho Chulapa, em que o Serginho avança livre e chuta pro gol, o Filiol estava saindo do gol e espalma, caindo já fora da área, a bola volta pro serginho que tenta encobrir o filiol já caído, já que ele não poderia botar a mão na bola, mas o filiol levanta a perna e consegue desviar a bola com o pé. Eu tinha uns doze, treze anos, não me lembro que jogo era esse, eu lembro que assisti ao vivo pela televisão (nosso aparelho ainda era preto e branco), mas esse lance ficou marcado pra mim.”

O lance aconteceu na partida Flamengo 4-1 Santos, pela Libertadores de 1984, no Maracanã e está no vídeo abaixo:




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A derrota de domingo passado fez (ou deveria ter feito) muitos caírem na realidade, dura por sinal, de que sem time não se consegue nada. Apenas o crescente distanciamento de seu torcedor, que aliás tem se mostrado a cada dia menos identificado com as cores de sua paixão.

Os recentes maus resultados do Flamengo suscitaram o cotejo entre duas filosofias administrativas: a que recomenda a contratação de grandes jogadores, formando um grande time que, com suas grandes arrecadações, auferirá renda suficiente para pagar os compromissos assumidos, ou a atual, mais conservadora, aconselhando que primeiro deve ser arrumada a casa, para depois então se partir para a formação de um time de primeira grandeza.

É fato que, por motivos distintos, a escalação atual da equipe somente motiva de sua torcida não mais que bocejos. Um time que não possui qualidade técnica para compensar a incompetência de seus dirigentes, que alegam ainda não disporem de condições para reforçá-lo. É um ciclo vicioso que parece não ter fim.

A marcha pragmática da diretoria atual se revela lenta, gradual e segura, não abrindo mão do equilíbrio no balanço patrimonial. Grande time, se e somente se depois de saneadas as finanças.

O planejamento global da administração acena para um futuro radioso. Consta que o ano que vem será mais frutífero, em função da consumação de algumas operações que trarão, em tese, a dívida atual a um patamar mais administrável. Recorda-se de discurso semelhante proferido ano passado.

Vista com olhos pacientes, a cavalgada da diretoria rubro-negra aparentemente reúne, com efeito, condições de, em ritmo de imperturbável trote, devolver o Flamengo à sua plenitude técnica e financeira.

Olhada, porém, pelas lentes da impaciência da torcida, talvez seja recomendável ao seu presidente provocar um galope capaz de fazer sumir, se possível de imediato, a acabrunhante visão de um time formado por determinados jogadores sem a menor condição de envergar a camisa do Flamengo.

Os dados disponíveis, assim como as perspectivas que oferecem, apontam o modelo administrativo adotado pela gestão atual como o mais correto possível e disponível. Apesar disso, e ainda assim, não elimina a suposição de que a indiscutível fragilidade da equipe não tem sido abordada com o senso de urgência e a vontade sempre inerentes à flama rubro-negra, usualmente indignada com prolongados ciclos de reveses.

Basta olhar para o exemplo de São Januário. Sem dinheiro, sem crédito e praticamente sem gastar um centavo, construiu-se aquele que tem demonstrado sistematicamente dentro das quatro linhas ser o melhor time do Rio de Janeiro.

Criticado por seus desafetos, que, entre outras perorações, alegam não reunir o conhecimento e a experiência necessárias para lidar com futebol (“Nunca pisou num vestiário na vida. Não entende, nunca entendeu e nunca entenderá de futebol”), e por certo apego ao cargo (teria quebrado um acordo em que abrira mão de buscar a reeleição), o presidente se defende. Alega estar o problema financeiro resolvido, através de reescalonamento de dívidas diversas, do encaminhamento da solução de penhoras judiciais, e da consumação de algumas situações que trarão enorme alívio no fluxo de caixa. “Ano que vem poderemos enfim decolar”, afirma.

Enquanto isso, o torcedor segue exposto a uma filosofia draconiana de contratações. Não se espere grandes investimentos para este segundo semestre. Nada de grande time, mas reforços pontuais, e assim mesmo após um forte trabalho de prospecção, em busca de alguma pechincha que valha a pena. “Estamos no caminho certo e temos certeza que os reforços a caminho irão sanar as lacunas da equipe”, acentua o presidente, sempre otimista.

Este otimismo, difícil de justificar, efetivamente tem permeado a atmosfera dos corredores da Gávea. Há grande expectativa pela conclusão de algumas negociações em andamento, embora de antemão já se saiba que não há nenhum protagonista em vista. Não há qualquer aquisição realmente significativa em curso.

Isso causa apreensão. O melhor jogador do time acumula constantes más atuações nos últimos meses, o zagueiro central é voluntarioso, até raçudo, mas dotado de limitações técnicas irreversíveis, o goleiro possui talento duvidoso até mesmo para figurar na reserva. A rigor, um ou dois jogadores têm sustentado o time com algumas partidas regulares. O que é pouco.

Além do teórico reforço no elenco, também coloca-se em xeque a figura do treinador como a peça mais importante do trabalho. Marcado por insucessos recentes, criticado pela obstinação em determinadas decisões e acusado (talvez injustamente) por uma série de decisões erradas, o treinador surge como o ponto central de um trabalho que, aparentemente, está diante de sua última oportunidade de demonstrar ao menos indícios de êxito, sob pena de provocar uma avalanche de efeitos imprevisíveis.

O fato é que o otimismo às vezes quase eufórico dessa diretoria com as perspectivas que julgam se abrirem para o restante da temporada não está balizado em nenhuma evidência real. Apenas promessas e frases feitas, amparadas em algumas mudanças pontuais que, se de fato trazem certa expectativa por uma evolução, também fazem mergulhar a administração na perigosa armadilha retórica dos resultados a longo prazo, sempre projetando um amanhã róseo em contraponto a um presente sombrio. É um cenário que não costuma terminar bem.

Até porque esse otimismo, essa aparente tranquilidade da diretoria, muitas vezes parece resvalar para o plantel. Ainda está marcada na memória de muita gente a descontraída reapresentação do grupo após uma importante e dolorosa derrota decisiva para o Vasco, em que, no dia seguinte à partida, jogadores, dirigentes e membros da comissão técnica disputaram uma animada pelada na Gávea, recheada de risadas e brincadeiras.

Enfim, para uma administração que se propôs a “salvar” o clube, em que pese os evidentes pontos positivos, ainda falta muito para que se possa supor que os objetivos apregoados tenham sido atingidos, mesmo em parte. Ao torcedor, castigado por anos e anos de vexames e maus resultados, resta esperar, pacientemente, que algum dia o tão prometido pote dourado no final do arco-íris efetivamente apareça. E que não se revele, ao final das contas, recheado do célebre “ouro de tolo”.

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O texto acima é uma coletânea de reportagens publicadas em diversos jornais do Rio de Janeiro ao longo de julho de 1978, com adaptações.

O Flamengo, ao ser derrotado pelo Noroeste de Bauru por 1-0, despedira-se do Campeonato Brasileiro, terminando na 16ª colocação, não conseguindo melhorar o desempenho do ano anterior, em que obtivera o 9º posto.

Entre o início da administração FAF e a data dos textos, o Flamengo havia enfrentado o Vasco 6 vezes, obtendo 2 derrotas e 3 empates, sendo um dos quais o 0-0 que deu o Estadual de 1977 ao adversário, após decisão por pênaltis. E uma vitória, em um amistoso em Itabuna-BA.

A perda do Estadual de 1977 sinalizara a terceira eliminação seguida sofrida para o Vasco, em um intervalo de dois anos.

Até a data dos textos, o Flamengo havia disputado, ao longo do ano, 8 clássicos regionais, obtendo 1 vitória.


Márcio Braga é um dos melhores e mais vitoriosos dirigentes da história do Clube de Regatas do Flamengo, e uma referência interna extremamente respeitada e de consulta obrigatória. Mas o reconhecimento sempre é precedido por um tortuoso percurso, onde obstáculos aparentemente intransponíveis se empilham. Transpô-los. E venceu.