Saudações flamengas a
todos,
Eu poderia tentar
buscar elementos racionais que relativizassem a patética atuação do Flamengo na
derrota de ontem no Maracanã. Poderia argumentar que o Sheik, dentro das
circunstâncias, estreou de forma razoável, não se omitindo dos lances e mostrando
espírito de luta, em que pese algum individualismo. Vai ser importante. Poderia
frisar que o time apresentou, até sofrer o gol, uma dinâmica de marcação até
interessante, com alguma compactação e boa ocupação de espaços, embora por
muito pouco tempo. E, por fim, poderia apor que, com os retornos de Caceres,
Armero, Paulo Victor, a estréia de Guerrero e a possível (provável?)
contratação de um bom jogador para o meio-campo é possível pontuar que a equipe
de ontem estava sem meio time atuando. Desfalques de peso.
Quase um time misto.
Mas não quero
relativizar nada. Não estou com vontade de ser racional.
A verdade, senhoras e
senhores, é que há algum tempo o ofício de torcer para o Flamengo tem se
tornado penoso, árduo. Não, essa não é a enésima loa à mediocridade ostensiva
ou à falta de qualidade de jogadores. Não se tratará aqui de praguejar contra
as contratações erradas ou a falta de planejamento ou algo que o valha. Não é
das caneladas do Márcio Araújo ou das lambanças do Samir, o nosso Wellinton de
ébano, que se tratará nessas rabiscadas linhas.
É da falta de alma.
O Flamengo de hoje é um
amontoado de japoneses. Jogadores sem rosto, sem identidade, sem uma cara para
bater. É um punhado de seminaristas limpinhos e engomadinhos, acostumados a
recitar discursos prontos. Ao primeiro sinal de dificuldade, escondem-se sob os
lençóis. À primeira adversidade, derretem. Não são competitivos, não sentem na
carne a dor da derrota. Não choram o revés, a bola que lhe perfura o tal
bastião inexpugnável não lhes trespassa as entranhas. A perspectiva da vitória,
da imposição pura e simples ao adversário, que se constitui na essência básica
do esporte (de qualquer esporte) não lhes faz latejar o peito em brasa. A
intensidade do cotejo, do prélio simplesmente lhes suscita indiferença.
Ou medo.
O medo, senhoras e
senhores, parece estampado na face dos “soldados” que hoje defendem nosso
Manto. Nossa torcida, que costuma (costumava?) intimidar e assustar adversários
dos mais variados recantos, e com isso trazer uma vantagem psicológica relevante
para o campo de jogo, hoje consegue dispor do pendão de amedrontar nossos
próprios jogadores. Um verdadeiro bando de omissos, que costuma encontrar
guarida nas costas de uma marcação nem sempre rígida, que se acomoda nos passes
burocráticos horizontais, que, pés em brasa, enxotam a bola de qualquer risco
maior. Não jogam o jogo. São por ele engolidos.
O resultado é uma massa
amorfa, insípida, incapaz de fazer suspirar o mais fanático dos torcedores. Um
aglomerado que, exposto ao sol, à chuva ou aos mosquitos, derrete, desfaz-se
com uma facilidade desconcertante, destroi-se pelas circunstâncias com uma
submissão e uma desfaçatez absolutamente constrangedoras.
O Flamengo, senhoras e
senhores, notabilizou-se por buscar resultados improváveis, virar situações
adversas que pareciam irreversíveis. Em outros tempos, a uma primeira etapa
terminada em 0-2 eu reagiria, “dá para, no mínimo, empatar”. E empatava. E
virava. Hoje, a reação é “tem que fechar pra não ser goleado”. Crianças que se
deixam dar na cara. E baixam a cabeça. E têm medo. E se assustam com a massa
implacável em vermelho e preto que, qual esfinge, sabem que não decifrarão. E por
ela serão ingeridos.
Vai melhorar. Tem tudo
para isso. As relativizações, sempre elas.
Mas esse amontoado
nunca foi tão divorciado do que representa a liturgia do torcer e do viver
Flamengo.