Saudações flamengas a todos.
Essa
semana entro em clima de “buteco” e deixo onze passagens, “causos” e
curiosidades de momentos diversos, assim atendendo a muitos pedidos que costumo
recber. Ideal para conversa de bar. Boa diversão.
1 – A INVENCIBILIDADE
Após a inesperada derrota
para o Botafogo-PB, em março de 1980, o Flamengo engatará uma série de 35
partidas invictas no Maracanã contra equipes de fora do Rio. A série somente
será interrompida já em novembro de 1982, ou seja, 2 anos e 8 meses depois, com
a derrota para o Peñarol-URU, pela Libertadores.
Se levarmos em conta os
jogos inclusive contra equipes do Rio de Janeiro, o Flamengo terá permanecido
absolutamente invicto no Maracanã entre março de 1980 e abril de 1981, cerca de
um ano, um total de 38 partidas.
2 – CONTRA ZICO, NINGUÉM SE
CRIA
Outro dado pouco explorado
diz respeito à importância de Zico para o time do Flamengo. Com efeito, após a
traumática derrota para o Palmeiras (1-4) em 1979, o Flamengo, com Zico em
campo, NUNCA MAIS sofreu quatro gols em uma partida oficial e saiu derrotado. A
única exceção é a derrota de 1989 para o Corinthians no Pacaembu (2-4), pela
Copa do Brasil, mas esse resultado classificou o Flamengo e eliminou os paulistas,
sendo, portanto, uma meia-derrota.
Em 1981, Raul e Cantarele
viviam se estranhando e trocando farpas em sua acirrada disputa pela posição de
titular. A solução adotada pelo “novato” Carpegiani foi promover um rodízio
entre ambos, a ser iniciado exatamente em sua partida de estreia, contra o
Olimpia, no Maracanã. Mas Cantarele falhou no gol de empate dos paraguaios e
saiu do estádio hostilizado. Na partida seguinte, Raul teve ótima atuação
contra o Atlético-MG (2-2 no Maracanã) e, para os difíceis jogos no Paraguai,
foi efetivado de vez na equipe. Perguntado sobre o que achava do rodízio de
Carpegiani, o experiente goleiro emendou, “isso de rodízio só é bom em
churrascaria”.
4 – A BARRAÇÃO DA DISCÓRDIA
Taça Guanabara de 1981. O
Flamengo vai vencendo o Serrano de Petrópolis por 1-0, no Maracanã. A bola é
tocada ao jovem zagueiro Mozer, que vai dar um balãozinho no atacante, perde a
bola e por pouco o adversário não empata. O esquentado treinador Dino Sani não
titubeia, substitui no ato Mozer por Rondinelli. Mozer sai chorando de campo e
é orientado para não falar aos jornais. Todos os companheiros, especialmente
Marinho, saem em defesa do zagueiro na imprensa. Dino Sani, que havia adotado
um discurso duríssimo (“não aceito firula e brincadeira em campo”), abranda a
conversa, mas mantém Mozer barrado para o jogo seguinte (Olimpia,
Libertadores). Avisa que o titular é Rondinelli. No entanto, volta atrás e
resolve barrar o “Deus da Raça”. E depois reverte a barração, isso em dois
dias. Ninguém mais entende o treinador, nem se entende. O ambiente, às portas
de um jogo decisivo, se torna muito tenso, e a diretoria resolve demitir o
treinador, apesar do Flamengo ter acabado de conquistar a Taça Guanabara e
estar na liderança de seu grupo na Libertadores, o que gerou um comentário
ácido de Zico, “é, Dino, se te tiram quando você tá ganhando, nem quero estar
na pele do nosso treinador quando a gente começar a perder...”
5 – SE PODE COMPLICAR, POR
QUE SIMPLIFICAR?
Ao contrário dos tempos
atuais, a forma de disputa da Taça Libertadores nos anos 80 era baseada em
reuniões, conchavos, acordos e MUITA política (bem, a rigor, política existe
até hoje). E não foi diferente em 1981. O Flamengo, por exemplo, aceitou
decidir sua classificação na Primeira Fase em duas pedreiras no Paraguai com a
condição de fazer a segunda partida contra o Atlético-MG no Maracanã.
Outra negociação rebuscada
envolveu o mando de campo do jogo-extra. O Atlético-MG queria jogar em São
Paulo, o Flamengo em Goiânia. Várias imposições e concessões foram postas à
mesa, mas o Atlético-MG só aceitou fazer mesmo o jogo no Serra Dourada se o
árbitro fosse José Roberto Wright. Ironicamente, o árbitro hoje odiado pelos
mineiros foi por eles escolhido para a partida.
Por fim, a negociação das
chaves da Segunda Fase. Por inacreditável que pareça, o Flamengo trabalhou
muito forte para formar seu grupo com Nacional e Peñarol, os dois do Uruguai. O
rubro-negro estava de olho nas rendas e nas distâncias de viagem mais curtas. O
acordo esteve muito próximo de sair (havia a prerrogativa dos clubes escolherem
suas chaves, se houvesse acordo), mas na véspera o Deportivo Cali e o
Wilstermann, também de olho nas rendas do Flamengo de Zico, resolveram barrar o
acerto e a definição das chaves ocorreu mesmo por sorteio. No entanto, em 1982
o Flamengo conseguiu seu objetivo, e formou sua chave com River Plate e
Peñarol.
6 – A FALÁCIA DO TIME MISTO
Tornou-se um senso comum a
história de que o Flamengo “planejou meticulosamente a temporada de 1981,
ganhou a Taça Guanabara, jogou o Segundo Turno com um time misto e arrancou pro
Terceiro Turno com seus titulares”. Lenda.
O Flamengo disputou e venceu
a Taça Guanabara com seu time titular, verdade. Mas o Segundo Turno, que
coincidiu com a Primeira Fase da Libertadores, também foi jogado com o time
principal, sem priorizar qualquer competição. No entanto, com os sinais de
desgaste surgindo (o time perdeu o turno para o Vasco), o Flamengo resolveu
enfim pensar em colocar um time misto Mesmo assim, e mesmo com jogos no Caio
Martins e Petrópolis, por exemplo, e jogando terça, sexta e domingo, o Flamengo
só poupou seu time na quarta rodada, contra o Campo Grande. Colocou os
reservas, que jogaram mal e venceram a partida a duras penas (2-1). Depois desse
jogo, desistiu de vez da ideia. Ironicamente, os titulares foram novamente
poupados num jogo de Libertadores (Wilstermann, no Maracanã, 4-1), que já não
valia nada (Flamengo já estava na final). Ou seja, a tal “priorização” se
resumiu a DOIS jogos.
7 – QUANTO FOI MESMO?
1989, Taça Guanabara,
penúltima rodada. O Flamengo acaba de esmagar o modesto Nova Cidade por 8-1, na
Gávea. Assombrados, os repórteres entram em campo para fazer as entrevistas de
fim de jogo. Um jogador flamengo é abordado e começa “foi importante a
determinação da equipe, que se manteve concentrada, e assim conseguimos esse
placar de … ahn, quanto foi o jogo mesmo?”
8 – UM DIRIGENTE DE VISÃO
1992, corre o Campeonato
Brasileiro. O Flamengo tem jogo importante contra o Corinthians, no Pacaembu.
Um dos diretores vai aos jornais e resolve tecer suas considerações sobre o
time, que não vem em boa fase. “O Júnior, por exemplo. Uma nulidade, um
estorvo. Velho e lento, já deveria ter se aposentado. Vive de cobrar escanteios
e faltas. Não agrega nada”. Ninguém entende, mas o dirigente continua, “falo
isso desde o ano passado”. O presidente do Flamengo age rápido e afasta o
diretor. Júnior, que não polemiza, “cada um acha o que quer”, gasta a bola em
um chocolate contundente (3-1). No entanto, o agora ex-diretor segue falando um
monte, organiza-se politicamente e se tornará presidente do Flamengo. Um dos
piores, diga-se de passagem, algo não muito inesperado, dada a visão
demonstrada.
9 – MAS QUEM GANHOU MESMO?
1993, termina o jogo. O
Flamengo sai de campo coberto de caudalosas vaias, muxoxos, xingamentos e
apupos. Os jogadores se cumprimentam, alguns sorriem diante da reação da
torcida. Sim, porque, ao contrário do que parece, o rubro-negro acaba de vencer
a partida. De OITO. As vaias são em reclamação ao fato do time ter reduzido o
ritmo e não ter tentado fazer dez. Pior, reduziu tanto que o adversário, o
modestíssimo Minerven, da Venezuela, conseguiu dois gols nos dois minutos
finais. Aí, caiu mesmo na vaia, mesmo com os sonoros 8-2.
10 - “AQUI, NÃO!”
1994, Bebeto está em litígio
com o La Coruña, que admite negociar o jogador. O Flamengo manda uma delegação
à Espanha e inicia uma série de tratativas que vai evoluindo. Em dado momento,
a volta de Bebeto à Gávea é tida como certa, e alguns jornais, apressados,
chegam a noticiar o desfecho da transação (“Bebeto está de volta ao Flamengo”,
sai em letras garrafais). No entanto, o Flamengo tem uma partida contra o
Grêmio, no Maracanã. Mesmo com um time evidentemente limitado (Gilmar, Sávio e
Nélio liderando um punhado de garotos, como Índio, Marçal, Hugo e quetais) e
com o mau resultado (empate em 2-2), a torcida leva faixas e canta forte
hostilizando o provável reforço: “Chorããããão, aqui nãããããão!”. Por
“coincidência”, após o incidente as negociações emperram, Bebeto (que já havia
jurado amor ao Flamengo) declara-se “encantado” com La Coruña e fala que “nunca
pensou em sair” da Espanha. O negócio mela e o jogador permanece em seu clube
por mais uma temporada.
11 – UMA INSÓLITA DECLARAÇÃO
DE AMOR
1995, o atacante Jardel está
no auge da carreira, campeão da Libertadores pelo Grêmio. Após uma partida pelo
Brasileiro, em que marca dois gols no empate dos gaúchos contra o Flamengo,
Jardel é abordado por um repórter, que quer falar de sua impressionante
estatística de gols contra o rubro-negro. O repórter está em busca de alguma
declaração jocosa ou irônica, o Flamengo (com seu “ataque dos sonhos”) vive
péssimo momento e é alvo de chacotas diárias. Mas Jardel dá uma declaração desconcertante
e amplamente inusitada. “Verdade, eu faço muitos gols contra eles. Eu me motivo
muito e tenho grande prazer em fazer gols contra o Flamengo. Mas teria um
prazer muito maior, eu me realizaria muito mais, se fizesse gols pelo
Flamengo.”
Boa semana a todos.