Saudações
flamengas a todos.
Hoje
eu continuo a série sobre o (meu) Flamengo de todos os tempos, mas vou me
permitir alterar a ordem de apresentação dos craques do time. Afinal, Zico,
Zicão, Zicaço completa sessenta anos. E nada mais apropriado do que já escalar
e “entregar” a 10 justamente ao maior de todos os heróis que vestiram,
dignificaram e deram peso ao sagrado manto flamengo. Boa leitura.
* * *

É
jogo importante sim, mas para um dos times apenas, o adversário, que é o
Cruzeiro, precisando fortemente da vitória. O Flamengo já está virtualmente
eliminado, precisa nas próximas rodadas vencer, vencer, vencer e torcer para
que uma sacrossanta combinação de resultados o ponha na Final do Campeonato.
E
assim, uma multidão azul ocupa as arquibancadas. E grita por seu time, como
qualquer torcida berraria por seus jogadores em um jogo importante qualquer.


Entra
o trio de arbitragem. Vaias. Entra o Flamengo, tímidos aplausos de uma Nação
sempre presente mas algo desanimada. Apupos.
Agora
é o Cruzeiro, o Mineirão estoura em um mar de serpentinas, fumaça, poeira,
fogos, gritos e palmas que espelham uma forte e esperançosa expectativa azul.
Zêêêrooo, zêêêrooo, berram os seguidores da Raposa. Os jogadores batem bola,
posam pra fotos e dão entrevistas. Surgem os nomes no placar eletrônico.
Primeiro,
os do Cruzeiro. Balu, Paulo Isidoro, Careca, Heider, todos têm seus nomes
gritados, são aplaudidos e acenam em resposta, gratos. Como em todo jogo. Como
em qualquer estádio. A seguir, os nomes do Flamengo. Zé Carlos, Uidemar,
Leonardo, Ailton, Renato. Todos aparecem, os poucos acenos flamengos são logo
sufocados pelas vaias de uma esmagadora maioria. Uivos e até xingamentos,
recebidos com indiferença por jogadores já acostumados a seguir o criterioso
ritual que antecede a cada partida de casa cheia. No fundo, alguns até gostam.
Agora a coisa está perto do fim, o árbitro já esboça movimentos pensando na
etapa seguinte.
É
quando surge no placar o nome de Zico.

“Olê,
olê, olê, olê, Zicô, Zicôôô...”
Não
há quem deixe de estacar e contemplar a maravilhosa e singela homenagem
prestada pela torcida cruzeirense. Alguns mais pragmáticos estão assombrados ao
perceber que o mineiro está ovacionando o maior ídolo do adversário antes da
partida, outros não se lembram de precedente parecido. Os mais sensatos
simplesmente choram. É impossível ignorar que, neste momento, a torcida de
Minas Gerais está representando a gratidão e o respeito de milhões de
brasileiros e tentando apenas ser carinhosa com o ídolo que está partindo. E
lhe está proporcionando o reconhecimento que somente as grandes lendas do
esporte auferiram ao final de sua obra. A unanimidade.
“Obrigado,
Zico.”


No
entanto, a testemunha daqueles minutos que antecederam à partida do Mineirão
sabe, de forma consciente ou não, que jamais será o mesmo, após doar-se em
gritos de reconhecimento e amor ao ídolo Zico. Jamais será o mesmo, porque não
vai mais ter Zico, não vai mais ter o gênio, o craque, o paradigma de perícia
técnica, improviso artístico e conduta profissional reunidos em um só jogador,
não mais as tardes ou noites em que o futebol se sentia homenageado aos pés do
Galinho. Jamais será o mesmo, porque a partir de então não lhe restarão
mais do que as cálidas e cada vez mais esmaecidas lembranças de um órfão.
O
domingo se esvai. Mais um domingo de futebol. Não, não apenas mais um domingo.
O último.
O
último domingo de Zico.