Buongiorno, Buteco! Difícil pergunta, não? Tem uma série de senões. Cada época tem o seu porquê e sua razão de ser, de modo que tentar vivê-la fora de contexto pode ser um grande erro, em qualquer setor da vida. No futebol também. Pode ser uma grande besteira tentar reviver um determinado time, afinal de contas ele necessariamente é feito por seres humanos que não serão jamais repetidos, muito menos no contexto específico em que cresceram como seres humanos e atletas. Mas a pergunta e o próprio tema do texto de hoje vêm do fato de que na Europa, mais especificamente na Espanha, e até na Alemanha (puxa vida, jamais me imaginei escrevendo isso!), joga-se um futebol mais condizente com o que foi o futebol brasileiro do passado do que o futebol brasileiro atual.
Evidentemente, esse assunto diz respeito ao Flamengo, que já teve verdadeiros esquadrões em seus elencos, mas que hoje produz dentro de campo o reflexo do que é esse pobre futebol brasileiro, lembrando que estamos falando de um dos times de melhor campanha e resultado da temporada de 2011. Ocorre que não se pode mais valer de desculpas do gênero "ah, mas o futebol de hoje é assim", primeiro, porque, como dito, na Europa há clubes e seleções jogando um futebol muito mais ofensivo e bonito. E eu quero deixar bem claro que não estou falando apenas dos grandes expoentes. Querem um exemplo? Fui visitar minha irmã ano passado em Portugal e tive a oportunidade de assistir a Sporting Lisboa x Portimonense, no estádio João Alvalade, partida vencida pelos anfitriões por 3x2. E não é que o Portimonense, derrotado e rebaixado no campeonato português, jogou exatamente com aquele esquema da Alemanha na Copa do Mundo? Ofensivo, incomodou o Sporting o tempo todo, mas a categoria individual desses últimos acabou prevalecendo.
Nem precisamos ir tão longe: basta lembrar os costumeiros bailes táticos que os times argentinos costumamdar nos brasileiros nas Libertadors. O Fluminense eliminou o Boca Juniors? Sim, mas quem lembra daquela partida no Maracanã certamente se recordará do melhor posicionamento em campo dos argentinos, da maior posse de bola, das inúmeras chances perdidas e dos gols marcados pelo Fluminense graças a falhas do goleiro e com a bola desviando na barreira numa cobrança de falta. Ah, e não nos esqueçamos do exemplo mais atual possível, que é a Universidad de Chile, que, com um elenco barato, joga um futebol correto, ofensivo e taticamente irrepreensível, muito superior a qualquer time brasileiro atual.
Na verdade, eu sempre achei que 1982 foi um ano negro para o futebol arte e quando dizia isso a amigos em conversas eles pensavam que era apenas pela seleção brasileira que perdeu para a Itália na Copa da Espanha, mas não foi apenas isso; havia também aquela seleção fantástica da França, liderada por Michel Platini (muito mais jogador do que Zinedine Zidane, vão me desculpar), que jogava um futebol arte de primeiríssima linha. Ah, como seria uma final entre aquelas duas seleções, sempre imaginei. E o ideal teria sido a URSS de Oleg Blokhin na semifinal, pois era outro time que jogava um futebol refinadíssimo e de toque de bola solto, muito bonito.
À medida em que os anos se passaram o futebol no mundo todo foi ficando feio, truncado, cheio de volantes, tal como se vê aqui no Brasil hoje, tal como se viu na Copa do Mundo da Itália em 1990. Percebam as datas. Vinte anos atrás. Em 1998, Zagallo ainda desafiou tudo isso e, com todas as críticas que se possa fazer a ele (e eu tenho mais de uma centena delas), ainda colocou uma seleção ofensiva para disputar aquela Copa. Mas o certo é que a última coisa que eu esperava é, em 2010, ver o futebol arte renascer na Europa, uma parte dele na Alemanha, e no Brasil apenas essa terra devastada, na qual se joga o futebol de 1990.
Pois bem. Fica então a pergunta: é possível resgatar o passado? Entendam o que quero dizer: voltar a produzir jogadores técnicos; voltar a ter como característica dos jogadores vindos da base o toque de bola vertical, buscando o gol? Bem, o Barcelona conseguiu, mas sabemos que, lá, dinheiro não falta para pinçar jogadores do mundo inteiro. Mas será que é só dinheiro? Parece que não, né? Entra aí filosofia, projetos de longo prazo não interrompidos, organização, número de sócios espalhados pelo mundo e em dia com as contribuições, austeridade fiscal, estádio próprio...
Bem, eu gostaria que o Flamengo liderasse esse movimento, mas parece que passaremos mais um ano com um treinador e uma diretoria cujas ideias não se compatibilizam com esse modelo. Alguém acredita que isso seja possível? Algum dia?
Bom dia e SRN a todos.