sábado, 26 de março de 2011

Meu Fato Marcante: Relato de um Flamenguista Finalmente Vingado

Relato de um Flamenguista Finalmente Vingado

Por Rafael Santos, de Brasília/DF

Estive no Maracanã, em companhia de meu cumpadre e amigo David, vulgo “Anselmo do Cerrado”, no fatídico gol de barriga do Renato Gaúcho. David, cercado de malditos tricolores na infância, sempre odiou com todas as suas forças o Fluminense. Do gol de barriga até entrarmos no avião de volta a Brasília na segunda de manhã não pronunciou sequer uma palavra. Cheguei a temer por algo mais grave, que demandasse uma terapia intensiva. Foi uma frase – “o avião tá joia” para se referir a um remendo na asa da aeronave, balbuciada por puro instinto de sobrevivência, que acabou por me dar certeza de que ele iria se recuperar do trauma. Os anos seguintes foram horrorosos para ambos os times, mas tivemos o imenso prazer de assistir ao tricolor despencando para a terceira divisão. A vingança completa, contudo, ainda estava por vir.

O ano era 1999. E não é que o Fluminense veio a Brasília jogar uma partida importantíssima contra o tradicional time dos bombeiros da PM/DF chamado Dom Pedro? David então me convidou para ir ao Mané Garrincha secar os tricoletes. Quando passo em sua casa para buscá-lo, lá estava ele vestido com o Manto Sagrado. Eu perguntei: “Tá maluco? Quer morrer?” E ele retrucou: “O que é isso, Neguinho?” (meu apelido), "é um jogo de futebol como outro qualquer, o estádio é um local democrático e eu vou do jeito que eu quiser. Eu concordei, embora algo me dissesse que iríamos ter problemas.

Chegando ao estádio, na bilheteria encontramos o amigo tricolor Ricardo, que avisou: “David, se eu fosse você, tirava essa camisa. Eu sou tranquilo, mas aí dentro têm animais revoltados e dispostos a brigar por coisa muito menor.” David não lhe deu ouvidos e entramos no estádio. A torcida do Fluminense cantava e gritava os nomes dos jogadores, um a um, parecendo um bando de loucas desvairadas. Eis que de repente os nomes dos jogadores são trocados por gritos de “vai morrer, vai morrer”, “olha um flamenguista ali, vamo matar”.

Neste momento percebi que os gritos eram pra gente e pensei: F....! No meio do bolo, desce outro amigo, JV, empresário local do ramo de shopping centers e assíduo frequentador dos quadros sociais das Laranjeiras. Aí imaginei que estaríamos salvos, que o cara iria botar panos quentes e explicar para os amigos tricolores que a gente era da paz. P... nenhuma. O cara veio enlouquecido, virou para David e disse: “Seu FDP, eu nunca fui com a sua cara, desde a época do vizinhança (tradicional clube recreativo de Brasília), sai daqui agora”. E a filha dele (à época com uns 12 anos de idade) virava pra mim e dizia, com o dedo na minha cara: “Isso é provocação!”. Em seguida, um sujeito conhecido nas peladas de futsal como “LELÊ”, suposto amigo de David, desceu as arquibancadas com cara de ódio, partindo para cima. Foi quando ele me confidenciou: “Dou uma voadora nesse inseto e corro para a torcida do Dom Pedro.” Ledo engano, não havia torcida daquela “famosa” agremiação, pois todos os seus membros, integrantes do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, estavam trabalhando naquela noite.

Foi quando a Polícia Militar do Distrito Federal chegou para nos salvar. Separados por um cordão de isolamento, assistimos ao jogo solitários sob o olhar de centenas de tricolores se agarrando ao cordão e nos ameaçando. A pressão diminuiu quando Roger Secco fez um gol de falta aos 10 min do primeiro tempo e nos salvou do pior. O resto do jogo foi o Fluminense aguentando sufoco dos bombeiros, que quase empataram o jogo em várias oportunidades.

A satisfação de presenciar o Fluminense medindo forças na Série C do futebol brasileiro numa partida equilibrada contra o time do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal não tem preço. Para os outros prazeres da vida existe aquele cartão de crédito.

Posso dizer que tenho esse episódio inserido no meu currículo de torcedor e jamais o esquecerei.



Notas da Administração:


(1) esse texto é importante para os amigos verem como a paixão pelo Flamengo e pelo futebol carioca transcende as fronteiras do estado. É engraçado, mas não tentem isso em casa. Os fatos são reais, mas executados por "profissionais experientes", altamente treinados para tanto, rsrsrsrsrs.


(2) Escreva para a Administração do Buteco do Flamengo contando o seu Fato Marcante. No sábado esse espaço é reservado para você, amigo rubro-negro do Buteco, contar a sua história. E não precisa ser só uma.

Bom dia e SRN a todos.